O maior de todos os incentivos fiscais da reforma tributária

Debate se aproxima da reta final no Senado e eleva procura por benefícios; ao menos 25% dos produtos e serviços irão pagar menos imposto

Eduardo Cucolo

São Paulo

Saneamento e saúde devem ter a mesma tributação? Óleos de canola e dendê entram na cesta básica, ou a isenção ficará restrita aos de soja, milho e babaçu? Planos funerários podem ser equiparados aos de saúde? Bicicleta compartilhada é transporte público?

Essas são algumas das perguntas que embasam a defesa de novos pedidos de exceção ao texto da reforma tributária que tramita no Senado. Também mostram as contradições na hora de definir quem terá tratamento diferenciado.

Antecipam ainda uma questão importante: exceções geram contencioso. Especialmente nos tributos sobre valor agregado, os IVAs, como aqueles que começam a ser cobrados no Brasil em 2026 (daqui a apenas 14 meses).

Entre os representantes de setores que procuram esta coluna há os que ainda têm esperança de emplacar sua demanda. Outros prometem explorar possíveis contradições no Judiciário.

Um exemplo anedótico sempre citado pela professora Rita de la Feria, da Universidade de Leeds, na Inglaterra, é a discussão sobre como diferenciar biscoito e bolo para fins de tributação. Um tribunal inglês avaliou que só seria possível chegar a uma conclusão se fosse considerado o que acontece com o alimento após seu vencimento: se ficar mole, é biscoito; se ficar duro, é bolo.

No Brasil, ficaram famosos os casos da transformação de perfume em água de colônia, e de hidratante em desodorante, para pagar menos imposto. Com o mesmo objetivo, o bombom Sonho de Valsa virou waffle. A casquinha do fast food não é mais um sorvete, mas um composto lácteo.

Sem falar na questão da Crocs (calçados impermeáveis ou sandália com tiras de borracha/plástico?), nesse caso, para fins de aplicação de taxa antidumping na importação da China.

Nesta semana, o Senado entra em uma nova etapa nas discussões da reforma, e a disputa por tratamento diferenciado vai aumentar.

As discussões na Casa não pararam durante as eleições. A CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) realiza audiências públicas semanais desde setembro. Os senadores já apresentaram quase 1.500 sugestões (emendas) para alterar o texto.

Nesta terça, começam as audiências na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que deve apresentar em cerca de 30 dias a nova versão que irá para votação em Plenário. Há tempo para aprovar tudo ainda neste ano.

O difícil nessa reta final será separar ajustes técnicos para melhorar o texto de demandas que podem apenas resultar em judicialização e alíquotas mais elevadas.

O Banco Mundial fez uma atualização do seu simulador para a reforma (SimVAT). Com as exceções aprovadas na Câmara, a soma dos novos tributos deve ficar em 28,05% para os bens e serviços sem benefícios.

A reforma prevê uma trava na arrecadação, que equivale a uma alíquota média de 20%. Essa seria a tributação do consumo se ninguém pagasse meia. O rol de beneficiados já ocupa 50 páginas do projeto em discussão. O Centro de Liderança Pública estima que ao menos 25% dos produtos e serviços estão na lista.

Nos últimos meses, o relator Eduardo Braga (MDB-AM) recebeu 557 pessoas para reuniões fechadas. Na semana passada, divulgou a lista dos convidados para os últimos debates públicos. Que as discussões sejam orientadas pela máxima de que “o fim da cumulatividade trazido pela reforma é o maior de todos os incentivos fiscais“.


Fonte: Folha de São Paulo

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