CNJ aprova recomendação que busca combater litigância abusiva no Judiciário

Uso de processos para tentar prejudicar uma das partes é forma de assédio judicial a jornalistas e veículos de imprensa

Tayguara Ribeiro

São Paulo

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou, nesta terça-feira (22), um ato normativo que visa estabelecer parâmetros para identificação, tratamento e prevenção da litigância abusiva no Poder Judiciário.

A recomendação foi apresentada pelo presidente do órgão, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso, e pelo corregedor nacional de Justiça, Mauro Campbell Marques.

Segundo o próprio CNJ, a litigância abusiva pode ser entendida como a utilização do processo judicial para prejudicar uma das partes envolvidas em uma divergência.

Recursos que retardam o andamento do processo, apresentação de provas falsas, intimidação do adversário ou de testemunhas são alguns dos exemplos de ações que podem ser orquestradas com essa finalidade.

O mecanismo, inclusive, é utilizado como forma de assédio judicial a jornalistas ou veículos de imprensa. Em 2020 esse tipo de caso apresentou um pico e, desde então, se manteve em alto patamar, segundo levantamento da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).

O estudo mostra o aumento do número de casos ocorridos em razão de reportagens e aponta foco na mídia tradicional.

A pesquisa levantou 654 processos contra jornalistas, distribuídos em 84 casos. Segundo o levantamento, foram 54 em 2021, 52 em 2022 e 49 em 2023. Até março de 2024, foram contabilizados 5 casos. O pico foi 2020, com 261 ações. Entre 2009 e 2019, os valores variaram de 2 ações por ano (2013) a 39 (2016).

Segundo o CNJ, a litigância abusiva pode aumentar os custos processuais no Brasil e prejudicar o acesso à Justiça.

“Trata-se de iniciativa muito relevante que tenta resolver um mal de que todos os cidadãos são vítimas: o de instrumentalizar o Judiciário. Há muitos anos que o Poder Judiciário tem sido abarrotado de processos que são propostos com evidente má-fé, atrasando o andamento de julgamentos e impondo um acréscimo ao custo Brasil”, afirma Taís Gasparian, advogada da Folha.

Ao dar seu voto favorável ao ato normativo do CNJ, Barroso afirmou que a pretensão é assegurar que os esforços humanos e os recursos materiais sejam direcionados à garantia do acesso à Justiça.

“Evita-se que as partes dos processos, vítimas desse tipo de prática, tenham neutralizada sua capacidade de defesa ou de atuação”, disse.

Litigância abusiva contra a imprensa

O uso de recursos judiciais como forma de intimidar jornalistas e veículos de comunicação não é um fenômeno que ocorre somente no Brasil.

Nota informativa divulgada pela Unesco nesta semana aponta que entre os anos de 2019 e 2023 ocorreu um aumento de 60% no uso de denúncias contra jornalistas no mundo. Os dados são referentes à utilização indevida da legislação financeira dos países para pressionar, silenciar e intimidar os profissionais e as empresas do setor.

Dos 120 casos identificados pelo estudo, ao menos 56 contêm supostas acusações de extorsão. A maioria dos casos ocorreu na Ásia e no leste da Europa.

Um relatório de 2023, assinado por organismos que atuam com temas relacionados à liberdade de expressão, citou pela primeira vez preocupação com o uso indevido da lei e do sistema judicial para atacar e silenciar os meios de comunicação social.

O documento foi endossado pelo relator especial das Nações Unidas sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa para a Liberdade dos Meios de Comunicação Social e a Comissão Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos para a Liberdade de Expressão. Os organismos alertam que processos judiciais que se prolongam por um período excessivo prejudicam o trabalho jornalístico e o funcionamento dos meios de comunicação social e pedem para que os países adotem medidas para proteger e garantir o direito de procurar, receber e divulgar informações de interesse público.


Fonte: Folha de São Paulo

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