Decisão do STF sobre ressarcimento a hospitais privados põe pressão sobre tabela do SUS
Procuradorias estaduais temem que unidades particulares não se interessem em celebrar contratos com o sistema público
A solução encontrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de ressarcir hospitais privados por tabelas e índices da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), e não do Sistema Único de Saúde (SUS), em caso de atendimento a pacientes por ordem judicial, jogou luz sobre a distância dos preços pagos por procedimento na tabela do SUS em comparação com os praticados no mercado.
As procuradorias estaduais temem o desincentivo de credenciamento de hospitais privados ao SUS — uma vez que os valores da ANS são mais atraentes — e possível aumento da judicialização da saúde.
A preocupação das procuradorias estaduais é a de que a resposta do Supremo leve os hospitais privados a não se interessarem por celebrar contratos com o SUS, uma vez que os valores são inferiores aos propostos pela ANS — a diferença em alguns procedimentos pode chegar a 50%. Além disso, como ressaltaram fontes consultadas pelo JOTA, a tabela do SUS não é atualizada há 18 anos. Já na ANS, a atualização ocorre pelo Índice de Valoração do Ressarcimento (IVR), conforme a Resolução 367/2014, em que o IVR é calculado como 1,5 vezes o valor da tabela do SUS.
No memorial apresentado pela Procuradoria do Distrito Federal aos autos, já se aventava essa possibilidade caso se mantivesse o método pedido por hospitais privados (de ressarcimento a preços de mercado). “Valerá a pena deixar o SUS desguarnecido de opções de participação complementar, para que pacientes obtenham liminar e o preço unilateral e integral possa ser cobrado”, diz o texto. Há preocupação ainda entre as procuradorias de possível aumento da judicialização se a oferta de hospitais privados credenciados ao SUS diminuírem.
“Solução razoável”
Por outro lado, os hospitais privados acreditam que o Supremo deu uma resposta razoável à questão, mesmo que não tenha atendido 100% ao pleito pretendido. A vantagem está na fixação do parâmetro para uniformizar os valores no país.
Para o diretor jurídico da Confederação Nacional da Saúde (CNSaúde), Marcos Vinicius Ottoni, embora os valores da ANS ainda sejam mais baixos do que os preços de mercado, ainda sim é mais vantajoso do que os preços pagos pelos SUS. Mas, ele acredita que a solução não deve criar problemas no credenciamento de hospitais privados para o SUS, seja porque a decisão do STF limita-se às liminares judiciais seja pelo fato do sistema complementar já estar estruturado.
“Tem hospital que se prepara e se estrutura especificamente para atender o contrato do SUS. Assim, não tem problema: o hospital já sabe os valores da tabela e prepara a sua estrutura e funcionários para atender com base naquela tabela. O problema ocorre quando o hospital cria um protocolo, prestigia mais um tipo de cuidado e determina linha de atendimento, ou seja, cria um serviço mais caro e é obrigado a ser custeado por um serviço pela tabela do SUS”, explica. “Além disso, a solução do STF é esporádica, em casos de liminares”, complementa.
Presidente do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo, Francisco Balestrin, afirma que a decisão do Supremo vai pacificar o tema no país, uma vez que os juízes de todo o país vinham dando respostas diferentes à questão.
“Me parece que essa decisão é adequada. Pelo menos ela consegue colocar parâmetros. Até pouco tempo isso não era pacificado. Normalmente, os juízes diziam que os hospitais privados tinham que atender os pacientes públicos — o que não deixa de ser incorreto porque estamos tratando de vidas — mas quando se falava em remuneração sempre houve esse processo de discussão”, explica.
O julgamento no Supremo ocorreu na quinta-feira (30/9) e fixou a seguinte tese: “O ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde”.
Flávia Maia – Repórter em Brasília. Cobre tributário, em especial no Carf, no STJ e no STF. Foi repórter do jornal Correio Braziliense e assessora de comunicação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Faz graduação em Direito no IDP. Email: flavia.maia@jota.info
Karla Gamba – Repórter em Brasília.
Fonte: JOTA