Governo vai enviar projeto com aumento de tributos caso medidas do Senado não compensem desoneração
Haddad afirmou que projeto de lei com ajuste na tributação de CSLL e JCP será enviado ao Congresso junto à proposta de Orçamento de 2025, que será entregue na próxima sexta-feira
BRASÍLIA – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta quinta-feira, 22, que o governo vai encaminhar ao Congresso junto à proposta de Orçamento de 2025 um projeto de lei prevendo aumento das alíquotas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) – tributo cobrado sobre o lucro das empresas – e aumento da tributação dos Juros Sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das companhias aos seus acionistas.
PUBLICIDADE
De acordo com ele, as medidas servirão como uma espécie de garantia caso as propostas aprovadas pelo Senado não sejam suficientes para compensar a perda de receita com a desoneração da folha de pagamentosno ano que vem. A proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do ano que vem tem de ser enviada pelo governo ao Congresso até dia 31 de agosto.
O combinado com o Senado é que, se as medidas anunciadas pelo Senado não forem suficientes, a lei orçamentária tem que prever quais seriam, para os anos seguintes, as medidas compensatórias da desoneração”, disse Haddad.
“Então, isso vai ser encaminhado, não como medida provisória, mas como projeto de lei – e (as medidas) podem vir a não ser aprovadas se as projeções do Senado se confirmarem. Vamos encaminhar só as medidas que eventualmente tenham que ser aprovadas até fim do ano caso a estimativa do Senado não se concretize”, enfatizou.
Segundo o ministro, as medidas compensatórias aprovadas pelo Senado, e que vão passar ainda sob crivo da Câmara, devem resolver o rombo fiscal da desoneração apenas este ano.
“Do ponto de vista da compensação, nosso entendimento, que pode ser desmentido pelos fatos, é de que o que foi aprovado no Senado resolve 2024, mas nós vamos esperar que os cálculos mais otimistas do Senado sejam realizados. Se isso acontecer, tanto melhor para nós”, disse. Ele reiterou que esse assunto está bem endereçado e dará alívio para o governo decidir sobre eventuais contenções de gastos a fim de cumprir a meta fiscal de déficit zero.
Nesta semana, o Senado aprovou um projeto de lei que prorroga a desoneração da folha de pagamentos dos 17 setores que mais empregam e de municípios em 2024 e prevê uma reoneração gradual a partir de 2025, que termina em 2028. O texto ainda será votado na Câmara dos Deputados.
O projeto relatado pelo líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), lista medidas para compensar as perdas de arrecadação da União com o benefício, dentre elas: atualização de bens no Imposto de Renda; repatriação de ativos mantidos no exterior; renegociação de multas aplicadas por agências reguladoras; pente-fino no INSS e programas sociais; uso de depósitos judiciais esquecidos; uso de recursos esquecidos; e o programa de cadastro dos benefícios fiscais concedidos pelo governo.
Segundo o relator, as medidas devem gerar entre R$ 25 bilhões a R$ 26 bilhões aos cofres públicos e resolvem especificamente o buraco fiscal nas contas de 2024, já que muitas dessas propostas são limitadas e não trarão efeitos nos anos seguintes. Por isso, Haddad alega que é necessário enviar as novas medidas de tributação como garantia.
No mês passado, diante do impasse entre o governo e o Congresso, a Fazenda sugeriu incluir no texto da desoneração um gatilho para que, caso as medidas apresentadas pelo Senado não fossem suficientes para cobrir o rombo deixado pela desoneração, houvesse um aumento da CSLL como compensação. Porém, após uma reunião com Lula, Haddad e outros ministros, o governo abriu mão de mexer na CSLL. O mesmo ocorreu com JCP: o aumento da tributação chegou a ser previsto no texto, mas ficou de fora do relatório final.
Haddad reforçou que uma reforma de renda mais ampla deve ser enviada ao Congresso ainda em 2024, nos próximos 60 dias. Ele reiterou que o governo não tem a intenção de usar essa proposta para fechar o Orçamento do ano que vem.
O que é a desoneração da folha
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas.
Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política de desoneração foi prorrogada até 2027, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto do benefício nas contas públicas.
O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada. O ministro da Fazenda anunciou, então, um acordo para manter a desoneração em 2024 e negociar uma cobrança gradual a partir do próximo ano.
Imposto de herança na previdência privada é um erro e mira arrecadação, diz presidente da Fenaprevi
BRASÍLIA – O presidente da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), Edson Franco, avalia que a incidência do imposto de herança, o chamadoITCMD, sobre os planos de previdência privada é um “grande erro”. O executivo aponta intenção arrecadatória dos Estados com base em “argumento falho, parcial e limitado”.
O executivo alega que apenas uma minoria dos poupadores usa os planos para fugir do imposto estadual no momento da doação ou transferência dos valores – o chamado planejamento tributário. “Não dá para você dar um tiro de canhão para matar uma formiga”, diz Franco ao Estadão. Ele também destaca que 41% dos investidores dos planos VGBL ePGBL são da classe C: “Há uma percepção equivocada de que a Previdência é produto para classe alta, mas não é assim”.
O tema está em discussão em duas frentes: no Congresso, por meio do projeto de lei de regulamentação da reforma tributária; e, a partir desta semana, também no Supremo Tribunal Federal (STF), que começará a analisar o assunto na sexta-feira, 23, via plenário virtual. A ação atende a um pedido do Rio de Janeiro, onde o Tribunal de Justiça local declarou a inconstitucionalidade da cobrança sobre VGBL, mas liberou sobre PGBL
Na Câmara, o texto-base aprovado pelos deputados concede isenção do imposto de herança aos investidores que ficarem mais de cinco anos no VGBL. A regra não vale para o PGBL, que será tributado em qualquer prazo.
A redação do projeto, porém, gera dúvidas e preocupações na Fenaprevi: “Não são cinco anos da contratação do plano, e sim de cada aporte. Ou seja, mesmo as pessoas (com planos antigos, mas) que fazem aportes regulares mensais ou anuais teriam grande parte do patrimônio atingido”, avalia Franco.
Outro temor é em relação à portabilidade, um mercado que movimentou R$ 42 bilhões em 2023 no âmbito da previdência privada. “Se a portabilidade não estiver preservada (do imposto de herança), todo o dinheiro que migrar (de uma gestora para outra) será considerado como uma nova contribuição e ficará sujeito à tributação”, afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual a expectativa para o julgamento do STF, que começa nesta semana?
O julgamento é positivo, no sentido de pacificar o tema e trazer maior segurança jurídica. A nossa expectativa é positiva, porque a tese é muito clara. A gente entende que não há que se falar em tributação dos produtos atuais, nem PGBL nem VGBL. Mas isso é olhando pelo retrovisor, né?
Quais as preocupações olhando para frente, para o projeto de lei de regulamentação da reforma tributária?
Entendemos que essa previsão de incidência vai aumentar ainda mais a insegurança jurídica, porque a gente tem uma série de relações contratuais já vigentes. Então, temos de tomar muito cuidado com o tratamento dos contratos fechados anteriormente a isso, incluindo aspectos relacionados à portabilidade.
Como afeta a portabilidade?
A previdência é um dos produtos pioneiros em ter um instituto da portabilidade que favorece o cliente e promove uma concorrência saudável entre as empresas. Isso vem desde a lei complementar 109 (de 2001). Então, a gente tem que ter certeza de que os planos já existentes, inclusive os que usam o instituto da portabilidade, não perderão (a isenção do imposto de herança) – ou seja, que não serão alcançados por uma mudança dessa natureza.
O temor é de que o plano portado seja considerado um novo aporte?
Exato. Imagina o seguinte: eu tenho um plano no banco A, aí eu pego esse dinheiro e migro para o banco B. Se a portabilidade não estiver preservada (blindada do imposto de herança), todo o dinheiro que foi migrado será considerado como uma nova contribuição, e aí ficará sujeito à tributação. Ou seja, você estará prejudicando o cliente, porque você vai desincentivar a portabilidade e, consequentemente, a concorrência.
Olhando de forma mais ampla, como o sr. avalia as demais consequências dessa possível tributação?
Essa ideia de taxação (via imposto de herança) é um desserviço. O Brasil envelhece a um ritmo muito superior ao que se deu nos países europeus, por exemplo. E com um contexto social muito distinto, de uma classe média frágil, de uma renda média baixa e de um sistema previdenciário público que certamente tem um caráter de insustentabilidade. Portanto, qualquer proposta que desincentive a formação de poupança previdenciária privada vai na contramão dessa tendência demográfica inequívoca. Além disso, há uma percepção muito equivocada de que a previdência é produto para classe alta, mas não é assim.
PUBLICIDADE
Qual o recorte por classe social?
Os produtos de natureza previdenciária já atendem necessidades de classes sociais distintas. Só na previdência aberta, sem contar a fechada, são mais de 11 milhões de famílias protegidas por esses planos. Grande parte da classe média e 41% da classe C. Então, nós não estamos falando aqui de alguma coisa que vai atingir os ricos, como se poderia imaginar. Não são planos elitistas
Secretários de Fazenda dos Estados, técnicos do Legislativo e a equipe econômica alegam que a previdência privada é usada como instrumento de planejamento tributário – uma forma de o rentista fugir do imposto de herança no momento de transferir os bens à próxima geração.
CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE
Essa é uma forma muito limitada. As pessoas não estão entendendo o alcance que o sistema previdenciário tem hoje. A maioria dos nossos participantes é formada por pessoas que contribuem de forma regular. Além disso, a previdência aberta é composta por planos individuais e coletivos. Nesses últimos, esse tipo de comportamento já não é possível.
Mas os planos individuais são predominantes, respondem por 80% dos participantes…
Mesmo nos planos individuais, é uma minoria que entra no sistema com uma visão exclusivamente de planejamento tributário. Nós temos, hoje, um estoque de ativos, na previdência aberta, de quase R$ 1,4 trilhão. Olhar para a previdência e generalizar uma situação específica é um grande erro. Numa intenção arrecadatória dos Estados, com um argumento falho, parcial e limitado, a gente está, na verdade, criando um desincentivo para todo o sistema previdenciário, que tem uma função social super importante. Essas coisas têm de ser mais bem calibradas. Não dá para você dar um tiro de canhão para matar uma formiga.
O relator do projeto de lei complementar, deputado Mauro Benevides (PDT-CE), isentou do imposto de herança os VGBLs com mais de cinco anos. O objetivo, segundo ele, é blindar investimentos de longo prazo e focar no planejamento tributário. Isso ajuda a solucionar o problema?
Na verdade, não são cinco anos da contratação do plano, e sim de cada aporte. Ou seja, mesmo as pessoas que fazem aportes regulares mensais ou anuais teriam grande parte do patrimônio atingido pelo ITCMD. A gente vive numa situação em que os mais jovens têm mais dificuldade de poupar e, à medida que você vai crescendo na carreira, envelhecendo, a sua capacidade de poupança aumenta. Então, é natural que, nos últimos cinco anos da vida laboral, você acelere a formação de poupança – e todo esse estoque seria atingido. E aí, a gente entra num processo de insegurança jurídica brutal – e, além de tudo, a Previdência passaria a ser duplamente tributada.
Mas existem mecanismos de incentivo no Imposto de Renda… Existem diferentes mecanismos de incentivo para redução da tributação ao longo do tempo, mas a tributação existe. Nós não temos isenção de tributação, é um diferimento. A hora que o cliente resgata ou entra em renda, ele vai pagar o imposto devido. Claro, isso é uma vantagem fiscal, e tem que haver mesmo, porque a gente quer incentivar a poupança de longo prazo e a poupança previdenciária, mas a Previdência é um produto tributável. A Previdência não é uma poupança, não é uma letra de crédito, LCI ou LCA, que não tem Imposto de Renda. Então, passaria a ser duplamente tributada via Imposto de Renda, que já paga, e via ITCMD.
Fonte: Estadão