Senado revê privatização da Eletrobras para reduzir energia poluente
Projeto diminui contratação de reserva de energia gerada por térmicas; associações projetam alta na tarifa
Brasília
Três anos após a privatização da Eletrobras, o Senado tenta mudar a lei que obrigou os consumidores a pagarem pela contratação de 8 GW (gigawatt) de termelétricas, um dos pedágios exigidos pelo Congresso para a privatização.
Um dos argumentos em defesa dessa alteração é de que esse custo será reduzido em ao menos R$ 3,6 bilhões porque, no projeto de lei em tramitação para definir regras de funcionamento das eólicas offshores (em alto mar) e outros temas do setor, boa parte daquela exigência de contratação de energia das usinas térmicas, mais cara e poluente que as demais, é substituída por fontes mais limpas.
Em junho de 2021, o Congresso inseriu na lei que autorizou a privatização da Eletrobrás uma emenda que atendia ao lobby das térmicas, mais especificamente aquelas que usam gás natural, combustível de origem fóssil.
Pelo jabuti incluído de última hora, ficou definido que o governo federal se comprometeria a contratar 8 GW das térmicas como reserva de capacidade para o sistema por 15 anos.
A lei também criou regras para forçar a construção de novas usinas em regiões alheias ao planejamento do governo. Por exemplo: o fornecimento de gás por reservas ainda não exploradas na Amazônia.
Foi com base nessa lei que, em outubro de 2022, o governo fez o primeiro leilão para reserva de capacidade.
No leilão, o edital deixou claro que o teto do governo para futuros leilões de termelétricas seria de R$ 444 por MWh (megawatt-hora).
Para disputas futuras, a lei prevê a correção desse valor pelo IPCA. Ou seja, em maio, esse teto já estava em R$ 481,40.
Considerando a potência prevista na lei (8 GW) e o chamado “fator de capacidade” de 70% (o volume efetivo de energia a ser entregue para suprir o sistema), o compromisso de contratação do governo com termelétricas, anualmente, seria de R$ 23,6 bilhões.
Mudança
O projeto de lei das eólicas offshore muda a lógica de distribuição ao deslocar parte da contratação das térmicas para pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), centrais eólicas e também de hidrogênio (fontes mais limpas).
Ao mesmo tempo, aumenta para 9,7 GW a potência total a ser contratada via leilões, o que representa um aumento de 6,7% no total de energia a ser gerada.
Desse total, 4,25 GW serão garantidos por termelétricas, 4,9 GW por PCHs e centrais de geração hidrelétrica (na prática, usinas de menor porte) e 300 MW por eólicas.
Ao todo, o custo para garantir essa geração de energia deverá ser de R$ 20 bilhões —R$ 3,6 bilhões a menos do que o previsto com base na lei que privatizou a Eletrobras.
Caso toda a contratação de 9,7 GW fosse com termelétricas, o ônus anual para os cofres públicos seria de R$ 24,4 bilhões. Ou seja, R$ 4,4 bilhões a mais.
Tarifa
Nove associações do setor elétrico afirmam que o projeto levará a um aumento de 11% na tarifa de energia do consumidor. O alerta foi enviado ao presidente Lula em ofício.
Lideradas pela Abradee e Abracee, que representam distribuidoras e grandes consumidores, elas afirmam que o país não precisa de uma contratação tão grande de energia de reserva.
Além disso, elas consideram que, na conta da energia geradas por térmicas, não estão embutidos os custos para a construção dos gasodutos e terminais necessários para a distribuição.
Essas obras serão feitas por chamamento público e o custo não entrou na conta do leilão da energia. No entanto, será repassado para a tarifa posteriormente.
Pelos cálculos, a conta deve sofrer aumento de R$ 685 bilhões até 2050, um aumento de 11% na tarifa.
O projeto é um pleito do governo, que busca reduzir a dependência das térmicas ante o compromisso de descarbonizar a economia.
No ano que vem, o Brasil sedia a COP30 e tenta apresentar um portfólio de ações responsáveis na área ambiental.
A proposta já foi aprovada pela Câmara e aguarda análise da Comissão de Infraestrutura do Senado para seguir para o plenário.
Apesar dos ganhos, não há consenso no mercado. Oito associações do setor elétrico enviaram carta ao presidente Lula reclamando dos custos da geração de energia para a reserva de capacidade, ainda que baseada em fontes menos poluentes e a valores mais baixos. Com Diego Felix
Fonte: Folha de São Paulo