Cade se renova e espera julgar casos da Lava Jato e fusões em 2024
Número de negociações deve crescer e gerar mais demanda para o órgão, que inicia o ano com novos membros
Brasília
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) inicia 2024 com uma composição renovada, o que pode ajudar a autoridade antitruste a julgar casos antigos envolvendo a Lava Jato.
Além disso, o conselho deve analisar mais operações entre empresas neste ano diante da expectativa de aquecimento no mercado de fusões e aquisições.
O plenário do conselho administrativo da autarquia, a instância máxima no órgão, é composto por seis conselheiros e um presidente. Quatro conselheiros foram aprovados pelo Senado no fim do ano passado e ainda não participaram de sua primeira sessão, prevista para o início de fevereiro.
Com a saída dos conselheiros, a autarquia ficou impedida de julgar casos desde outubro. A chegada dos novos integrantes permitirá julgar casos relacionados a supostos crimes contra a concorrência no âmbito da Lava Jato.
Há hoje dois esperando para serem pautados, e não há prazo para que isso aconteça. Um deles envolvendo dez empreiteiras teve a análise iniciada, mas foi interrompida após um pedido de vista do presidente do Cade, Alexandre Cordeiro.
Um outro fator que deve influenciar os julgamentos e possivelmente abrir novas frentes é a discussão no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a validade das conclusões obtidas pela Lava Jato. Isso porque anulações determinadas pela corte constitucional podem levar as empresas a tentar reverter decisões tomadas no Cade.
A Lava Jato também estará em uma iniciativa interna da autarquia. O Cade pretende continuar neste ano o “mapeamento já iniciado sobre o impacto das suas decisões não apenas na esfera administrativa mas também nas esferas civil e penal, especialmente em casos de maior repercussão para a economia nacional”, disse Cordeiro.
Outro ponto em discussão a ser tratado em 2024 é um acordo com a Petrobras para a venda de refinarias. O Cade e a estatal assinaram um termo em 2019 no qual a petroleira se comprometia a vender oito refinarias. Em troca, a autoridade antitruste encerrou uma investigação concorrencial contra a empresa.
Desde então, três foram vendidas. O acordo para a venda de uma quarta foi rompido dias antes de ser efetivado, em novembro. Dias depois, a Petrobras solicitou ao Cade a revisão do acordo, o que está em análise.
O Cade tem como mandato investigar e julgar crimes contra a concorrência, como cartéis, e também aprovar ou vetar operações entre grandes empresas. A lei determina que toda operação envolvendo uma empresa que fatura R$ 750 milhões ou mais e outra com faturamento de R$ 75 milhões ou mais deve ser notificada ao Cade e só pode prosseguir após o sinal verdade da autoridade antitruste.
O Cade tem um prazo para julgar negócios entre empresas, que vai de 30 dias para os mais simples até 330 para os mais complexos.
Nesse ponto, o conselho está pouco movimentado neste início de 2024. Há apenas um grande negócio em análise, a compra da Kopenhagen pela Nestlé. A operação está sob análise da superintendência-geral do órgão, que tem o poder de aprovar o negócio sem restrições ou remetê-lo para uma decisão do plenário.
Outro negócio grande que pode ser avaliado em 2024 é a venda da Braskem. A empresa é controlada pela Novonor, a antiga Odebrecht, que quer se desfazer do ativo no quadro da sua recuperação judicial. A Petrobras é sócia minoritária na companhia, com 47% das ações com direito a voto.
Hoje, há dois atos de concentração —forma como a análise de operações entre empresas é chamada no Cade— nas mãos dos conselheiros.
A expectativa, entretanto, é que esse número cresça ao longo do ano.
“Nos últimos meses de 2023 e principalmente em dezembro observamos um aumento nas operações, e isso deve continuar em 2024, principalmente no segundo semestre”, avaliou o sócio da PwC, Leonardo Dell’Oso. ” Nossa expectativa é de um aumento leve de 2023 para 2024″, disse.
O chefe de investment banking do Santander, Leonardo Cabral, também vê um cenário melhor em 2024 do que em 2023. “No ano passado, o primeiro semestre foi bem mais fraco do que o segundo.”
Um fator importante na dinâmica do mercado é a queda de juros já em andamento no Brasil e aguardada nos Estados Unidos e Europa para algum momento de 2024.
Com juros menores, fica mais barato pegar grandes empréstimos para realizar operações de fusão ou aquisição.
Nem todo esse aumento deve ser captado pelo Cade, entretanto. Isso porque um setor que puxa as fusões e aquisições é o de tecnologia, muitas vezes envolvendo startups, que ficam abaixo dos critérios do Cade para análise, apontou Dell’Oso. Essa situação deve receber atenção da autoridade antitruste em 2024. “A digitalização da economia implica um debate sobre a adaptação do direito concorrencial a essas mudanças, tanto no âmbito das ferramentas de análise como no objeto de análise, considerando o impacto do poder de mercado de grandes plataformas em diversos setores”, disse Alexandre Cordeiro.
Fonte: Folha de São Paulo