Kassio paralisa julgamento sobre derrubada de restrição a políticos em estatais

Ministro pede vista e análise do caso ganha mais tempo; Mendonça vota para manter proibições

José Marques

Brasília

O ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista —mais tempo para análise— e paralisou nesta quarta-feira (6) o julgamento que questiona os dispositivos da Lei das Estatais que restringem a indicação de políticos para cargos em conselhos e diretorias de empresas públicas.

O julgamento havia começado em março, em plenário virtual, quando o ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado, votou a favor de derrubar as restrições. Ele também deu uma decisão liminar (urgente e provisória) que liberou a possibilidade.

O Supremo votou a julgar a ação, de forma presencial, com voto do ministro André Mendonça nesta quarta.

Mendonça discordou de Lewandowski e votou por manter as restrições previstas na legislação, que, segundo ele, resultaram em “redução significativa de situações de risco de corrupção”.

“[O risco] Não é em função das pessoas, é em função dos contexto que as pessoas estão inseridas”, disse o ministro.

“Boas pessoas em contextos inadequados estão sujeitas a situações que não estariam em outros contextos”, acrescentou. “O melhor remédio para a boa governança, ou, em outras palavras, o melhor remédio contra a corrupção, é a prevenção”.

Mendonça argumentou, ainda, que esta foi a opção do Congresso e que o Supremo deveria mantê-la.

Em seguida, Kassio pediu vista e disse que devolverá a ação no período mais breve possível.

Outros ministros, porém, deram indicação de como votariam a respeito do tema. Um deles foi o presidente da casa, Luís Roberto Barroso.

Ele destacou os argumentos de Mendonça a respeito da redução dos riscos de corrupção e afirmou: “o Congresso definiu nesse sentido e eu tenderia a não declarar a inconstitucionalidade [da lei]”.

“Embora eu tenha, de certa forma, deixado a transparecer uma visão, não estou fechado a ouvir as ponderações que virão do ministro Kassio e dos demais colegas”, disse.

Já Gilmar Mendes fez manifestações que apontam uma tendência contrária à restrição.

“Isso vai para muito além do que seria um critério de razoabilidade. Eu me lembro, por exemplo, que o último chefe financeiro da campanha de Fernando Henrique [Cardoso] foi José Gregori. Poderia, então, ser ministro, mas não poderia ser chefe nem de um conselho de administração”, disse o decano do Supremo.

“Será que isto faz sentido? Será que isto não leva a um critério a um arbítrio nesse contexto?”, questionou.

Desde o começo do ano, o fim das restrições impostas pela Lei das Estatais é de interesse do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem o objetivo de abrir caminho para encaixar aliados políticos nas companhias.

Ainda em março, Lewandowski deu uma decisão liminar (provisória) que afrouxou a possibilidade de esses políticos serem nomeados.

Ele derrubou a quarentena de 36 meses imposta a dirigentes de partidos políticos e a pessoas que atuaram em campanhas eleitorais para ocuparem cargos de direção em empresas pública e em sociedade de economia mista.

O ministro também determinou a derrubada da vedação à indicação de ministros de Estado, secretários estaduais e municipais para cargos de conselho de administração e diretorias.

“A alegação de que os dispositivos impugnados servem para reduzir o risco de captura da empresa estatal por interesses político partidários ou sindicais, fator supostamente responsável por alguns casos notórios de corrupção, não se sustenta”, disse, em sua decisão.

O seu voto continua válido. Por isso, o seu sucessor na corte, ministro Cristiano Zanin, não irá votar.

A Lei das Estatais foi aprovada pelo Congresso em 2016, em meio aos escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras e outras empresas públicas descobertos pela Operação Lava Jato.

Integrantes do governo defendiam que essa regra tem como premissa a criminalização da política.

O questionamento ao Supremo foi protocolado em dezembro de 2022, após a vitória de Lula, pelo PC do B, aliado histórico do PT.

O partido afirmava que a “suposta finalidade” da Lei das Estatais (assegurar a eficiência da gestão dos administradores das empresas públicas) “não é atingida por meio do impedimento de indicação de pessoa que tenha vínculos político-profissionais com a administração pública ou que tenha participado de atividades partidária-eleitorais nos últimos 36 meses”.

“Isso porque tais elementos não resultam, necessariamente, em uma gestão imparcial por parte dos administradores indicados. Fosse assim, seria forçoso reconhecer a imparcialidade automática de juízes, promotores, procuradores, e militares das Forças Armadas da ativa que, antes do ingresso efetivo em seus respectivos cargos, tenham atuado em estrutura partidária ou eleitoral”, diz a ação, assinada pelo advogado Gustavo Teixeira Gonet Branco.

O PC do B pediu que, se o Supremo não suspendesse completamente o dispositivo da Lei das Estatais, que ao menos fixe o entendimento de que é possível a indicação de políticos para postos de cúpula das empresas públicas desde que eles encerrem o vínculo partidário a partir do efetivo exercício no cargo.


Fonte: Folha de São Paulo

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