Reforma do IR tira subsídio de remédio contra câncer e aids e mantém para aviões e barcos

Fim de isenções de PIS/Cofins pode gerar aumento de 12% no preço de mais de 18 mil produtos farmacêuticos
Fábio Pupo

Brasília

O projeto de lei do Imposto de Renda aprovado pela Câmara dos Deputados na quarta-feira (1º) removeu benefícios tributários para medicamentos e manteve os aplicados a aeronaves e embarcações.

O projeto revoga as normas que abatem PIS e Cofins de empresas que fabricam ou importam medicamentos e produtos farmacêuticos. Na lista atual de isenções estão remédios de uso contínuo para tratamento de doenças como câncer, hipertensão, Aids, doenças cardíacas e diabetes, além de antibióticos, anti-inflamatórios e outros.

De acordo com os fabricantes de medicamentos, o fim de isenções de PIS/Cofins dos medicamentos vai acarretar o aumento de 12% no preço ao consumidor de mais de 18 mil produtos farmacêuticos –conforme mostrou o Painel SA. Segundo eles, o SUS (Sistema Único de Saúde) também será impactado.

“No final, quem pagará a conta, no nosso caso, será o consumidor de medicamentos, todos nós”, afirma Nelson Mussolini, presidente executivo do Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos), em nota.

Emendas chegaram a ser apresentadas para retirar o trecho do projeto. Mas o relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), as descartou afirmando que o subsídio para medicamentos tem caráter regressivo –ou seja, acaba beneficiando mais os ricos.

O deputado citou em seu relatório o Boletim Mensal sobre Subsídios da União, do Ministério da Economia. O documento concluiu que os 20% mais pobres da população usam 6,3% dos recursos concedidos pela medida, enquanto os 20% mais ricos se apropriam de 43,5% do total.

Entretanto, o mesmo documento concluiu também que a política é menos concentrada do que a renda no país. Além disso, o boletim do Ministério afirma que não existiam elementos suficientes para analisar os efeitos de uma mudança de tributação do setor sobre o preço dos medicamentos e os orçamentos do governo e das famílias.

Enquanto isso, o deputado manteve benefícios para aeronaves e embarcações. A retirada dos subsídios nesses casos estava prevista no texto como uma maneira de reduzir em R$ 4,5 bilhões o impacto fiscal para a União com os cortes no Imposto de Renda.

No caso das aeronaves, o deputado decidiu manter os benefícios dizendo que o setor foi afetado pela Covid-19. “Trata-se de setor econômico excessivamente atingido pelos impactos econômicos causados pela pandemia do coronavírus, e sua reoneração pode trazer gravíssimas consequências à viabilidade do transporte aéreo no país”, escreveu Sabino.

O relator acolheu emendas para manter incentivos fiscais relacionados ao Imposto de Importação e ao IPI de embarcações dizendo que haveria pouco benefício. “O ganho que seria obtido a partir dessas revogações seria ínfimo para a proposta, ao passo que poderia trazer consequências negativas às regiões altamente dependentes do transporte hidroviário”, afirmou o deputado no relatório.

Deputados que defenderam a manutenção dos benefícios para embarcações –como do PT, do PSB e do PDT– afirmaram que, entre os programas ameaçados, estariam aqueles criados para incentivar a Marinha Mercante Brasileira e que teriam permitido o que chamaram de aumento da competitividade dos estaleiros nacionais.

“[A desoneração das embarcações] reduziu os custos envolvidos e passou a permitir a realização do reparo e manutenção periódica obrigatória das embarcações brasileiras em estaleiros brasileiros”, afirmaram os parlamentares.

Com a manutenção dos benefícios para aeronaves e embarcações e as demais mudanças, analistas viram perda de arrecadação para a União –mas ainda faziam as contas do tamanho do impacto até o fechamento deste texto.

“O resultado do PL 2337, aprovado nesta noite a toque de caixa, será um rombo na arrecadação”, afirmou em rede social Felipe Salto, diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente, órgão do Senado que monitora as contas públicas). Os técnicos devem apresentar um cálculo nesta sexta-feira (3).

O texto-base do projeto que muda as regras do Imposto de Renda começou a ser discutido diretamente no plenário sem um texto protocolado.

Deputados da oposição, como do PSOL, ressaltaram que estavam se posicionando de forma favorável à discussão desde que o projeto fosse de fato o debatido nas horas anteriores.

Estimativas de arrecadação, de manutenção de desonerações e do consequente impacto do texto final sobre os cofres públicos não foram apresentadas no plenário.

Após a aprovação, o deputado foi questionado sobre qual o impacto fiscal do projeto para os cofres públicos, mas não enviou os números até o fechamento deste texto.

A Receita Federal também foi procurada para calcular os números, mas afirmou que não iria se manifestar até o fim da votação dos destaques (pedidos de novas modificações no texto) e de uma análise sobre o texto final.

O texto aprovado estabelece uma cobrança sobre dividendos, reduz alíquotas cobradas de empresas e acaba com o JCP (juros sobre capital próprio, mecanismo análogo ao dividendo).

Para a pessoa física, corrige a tabela da pessoa física do Imposto de Renda, que estava defasada desde 2015, e eleva de R$ 1.903,98 para R$ 2.500,00 por mês o salário isento da tributação.

No fim da tarde de quinta-feira (2), um dia depois de aprovar o texto-base, os deputados terminaram de deliberar os destaques.

A maioria das propostas foi rejeitada em plenário. Só foi aprovada a mudança de 20% para 15% da alíquota incidente sobre dividendos, o que impacta ainda mais as contas públicas.

Eles concluíram a votação do projeto, que, agora, segue para o Senado. Na Casa vizinha, o presidente Rodrigo Pacheco (DEM-MG) afirmou que, assim que a apreciação do projeto terminasse na Câmara, o texto seria submetido à tramitação regular \”para que o Senado possa refletir\”.​


Fonte: Folha de São Paulo

Traduzir »