Controle fiscal dita regras do jogo
Havia um anúncio na década de 1980, da vodca da marca Orloff, cujo mote da campanha era “Eu sou você amanhã”. Alguns economistas adotaram a expressão para comparar os planos econômicos heterodoxos do Brasil e da Argentina, que eram editados em sequência na tentativa de retomar o controle da inflação.
O Plano Cruzado, de 1986, foi inspirado no Plano Austral de lá. Até uma das expressões de lá, “tablita”, foi adotada aqui. Outros planos lá e aqui, até 1990, seguiram esse padrão. A partir de então, a gestão macroeconômica dos dois países seguiu rumos diferentes. Aqui, em 1994, o Plano Real foi o último de uma sucessão deles. Lançou uma nova moeda, limpa da correção monetária passada, e um programa fiscal rígido.
Na Argentina, em 1991, num quadro de inflação alta e crescimento baixo, o Plano Cavallo tornou o dólar conversível e trouxe alguns anos de crescimento alto e baixa inflação. Uma década depois, acabou em crise. Mais planos e mais crises aconteceram lá. Atualmente, apresenta déficits fiscais, recessão e inflação elevada, 12,4% em agosto.
Nesse contexto, a percepção em relação a propostas de dolarizar a economia, ou fechar o banco central, soam extemporâneas.
A dolarização funciona bem em alguns países, como Panamá, e mal em outros, a exemplo do Zimbábue, que se dolarizou, mas por falta de dólares teve uma crise e voltou atrás. Quando a demanda de moeda é maior que a oferta, a dolarização não funciona.
A moeda oficial na Argentina é o peso, mas o dólar é de fato a unidade de conta e de reserva de valor. As casas de câmbio funcionam sem interrupção. Estima-se que a população tem cerca de US$ 250 bilhões entesourados em suas casa ou em cofres de bancos. Confiscos no passado fizeram a população perder a confiança no peso
A projeção de inflação para este ano no Brasil é de 5% e lá é superior a 100%. O Brasil deve crescer cerca de 3%, e lá deve cair 2%. São números que justificam o desejo da população de realizar mudanças na economia.
O desempenho do Brasil se explica por um plano (o Real) que foi sendo ajustado ao longo dos anos com foco no que é melhor para a construção de um futuro. O processo evolutivo continua, e isso confirma que estamos na direção certa ao perseverar no equilíbrio das contas públicas, no crescimento e na redução da desigualdade social.
Cada país tem seu próprio caminho, mas a matriz comum deve ser a solidez fiscal somada à rejeição das tentações populistas. Promessas de justiça social são desejáveis e fundamentais, desde que tenham bases consistentes para sua realização. Caso contrário, o efeito pode ser o oposto. Já as ideias mirabolantes são inviáveis por definição.
Fonte: Estadão