Fundo para compensar Estados e municípios por perda com reforma terá R$ 48 bi por ano, diz Lopes
BRASÍLIA – O coordenador do grupo de trabalho da reforma tributária, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), afirmou ao Estadão que o “ponto de partida” das negociações é o repasse de R$ 48 bilhões por ano para o fundo que vai compensar Estados e municípios por perdas na arrecadação com a reforma tributária.
Esse é o valor que estava sendo negociado na legislatura passada para o período de 10 anos (R$ 480 bilhões) do chamado Fundo de Desenvolvimento Regional, mas esbarrou na resistência do ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, que via na criação do fundo uma tentativa de sangrar os cofres da União.
Segundo Lopes, entre as propostas para abastecer o fundo está uma parcela de 5% do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) federal (o novo que será criado para substituir o PIS, Cofins e IPI).
A outra opção é uma combinação de uma parcela do IVA federal com um porcentual do “excesso” de arrecadação do IVA nacional, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Pela proposta de reforma dos tributos incidentes sobre o consumo de bens e serviços, o IBS unificará o ICMS (principal tributo dos Estados) e o ISS (municípios) num modelo de tributação dual: o IVA federal e nacional.
O fundo será criado para diminuir as desigualdades regionais entre os Estados e compensar a perda de parte da autonomia que os governadores terão para fazer política de desenvolvimento econômico com a supressão do poder de darem incentivos fiscais para atração de novos empreendimentos aos seus Estados.
A concessão desses incentivos fiscais fomentou a guerra fiscal entre os Estados e aumentou o caos tributário do País nas últimas décadas. Ao longo das várias tentativas de aprovar a reforma, o tamanho do fundo tem sido sempre um dos temas mais sensíveis.
Lopes disse não haver valor definido e pontuou que as negociações ainda estão acontecendo. Mas destacou a importância da criação do fundo para pavimentar a aprovação da reforma tributária.
O deputado petista contestou a avaliação, que cresce no Congresso e entre os tributaristas, de que não há tanta convergência entre os Estados, como tem sido difundido pelo governo. O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), defendeu, na semana passada, que as dívidas dos Estados com a União entrem nas negociações como contrapartidas para os Estados que perdem com a reforma.
“O que eles querem é o fundo de desenvolvimento. Um sistema novo, com dois objetivos: fazer a transição do fim da renúncia fiscal e criar uma nova política”, afirmou.
Sobre os incentivos da Zona Franca de Manaus, o deputado defendeu um novo modelo de desenvolvimento para a região, mas os detalhes ainda não estão fechados. Os parlamentares do grupo de trabalho terão, nos próximos dias 13 e 14, uma reunião, em Manaus, na Zona Franca e com os governadores dos estados do Norte.
Tratamento diferenciado para setores
A demanda de diversos setores para um tratamento diferenciado de alíquotas é outro ponto sensível nas negociações que o coordenador avaliou que teve avanço. Para Lopes, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45, que tramita na Câmara, já resolve muitos dos problemas ao constar no texto os setores que poderão ter tratamento diferenciado: agronegócio, transporte de carga e de passageiros, educação, saúde e as entidades assistenciais.
É um divisor de água importante que constrói o consenso para aprovação da reforma tributária”, disse. Esses setores cobram que a previsão do tratamento diferenciado esteja na Constituição. “Isso foi um grande avanço. Eu acho que é a tendência”, disse ele, deixando claro que os setores com tratamento diferenciado deverão estar previstos no texto constitucional no relatório. “É uma tendência que esses setores terão essa válvula de escape”, acrescentou.
Segundo ele, um dos pontos em discussão é se a lei complementar, que regulamentará os dispositivos da reforma, será apresentada em paralelo à tramitação da PEC. A outra opção é aprovar a PEC e depois estabelecer um debate em relação ao tratamento diferenciado.
O deputado destacou que a calibragem das alíquotas do novo imposto para esses setores com tratamento dependerá dos cálculos que estão sendo feitos. “Nós já estamos recebendo esses cálculos. Vai ter que fazer esse encontro de contas para fazer a alíquota de equilíbrio”, disse.
Segundo ele, para setores como saúde e educação, poderá ter uma alíquota de equilíbrio e, ao mesmo tempo, ter o cashback, mecanismo de devolução de impostos. “Pode ter dois tratamentos diferenciados. Mas pode haver setores que só tenha cashback”, explicou.
Na sua avaliação, o sistema de cashback permite a implantação de algumas políticas, como de gênero, sociais e de raça: “Não estou dizendo que vai ser utilizado, mas no momento que você cria o cashback como instrumento de progressividade tributária, aquelas pessoas com menor poder econômico poderão ter o seu recurso (o imposto) de volta”.
Lopes contestou as críticas de que o cashback é de difícil operacionalização e ponderou que o IVA do século XXI conta com os avanços da tecnologia, que facilitaram creditar o imposto, cobrar e fazer a partilha automática da arrecadação entre Estados, Municípios e governo federal.
O coordenador do grupo de trabalho da reforma informou que talvez seja necessário um programa especial para os pequenos produtores agrícolas para que eles também possam receber o crédito do imposto dos insumos que compram e vendem para as etapas seguintes da cadeia, como supermercados e indústrias.
“Eles compram insumos, equipamentos, máquinas com muito imposto (embutido). Ele vai comprar mais barato”, destacou. Ele disse que a reforma vai acabar com o crédito presumido, benefício que existe hoje para o setor.
Lopes disse que pediu ao Ministério da Fazenda que desse um tratamento especial para esses pequenos agricultores.
Disputa Senado e Câmara
Para ele, a disputa entre o Senado e Câmara em torno da forma de tramitação das Medidas Provisórias (MPs) não prejudicará a votação da reforma. Essa é uma preocupação, porém, que ronda os defensores da reforma, que veem risco de ocorrer uma repetição do que aconteceu no governo Bolsonaro, quando a disputa política envolvendo as duas propostas de emenda também paralisou a discussão no Congresso.
Lopes disse que o grupo de trabalho da reforma tributária na Câmara está dialogando com os senadores para fazer um alinhamento da proposta. O próprio relator da reforma na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), tem se antecipado e feito reuniões com senadores.
“Não há uma disputa de protagonismo e não há uma disputa entre oposição e o governo em relação à reforma tributária”, ponderou. A postura, disse ele, tem sido colaborativa dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Segundo o coordenador, as divergências que restam são pequenas em relação ao ganho geral que a aprovação da reforma vai proporcionar. “Vamos resolver o problema dos créditos (acumulados) do passado, da guerra fiscal, o modelo federativo brasileiro será mais de colaboração, o exportador que não consegue vai creditar e a indústria brasileira vai ficar mais competitiva”.
Fonte: Estadão