Inverno de criptomoedas não diminui apetite de empresas e investidores
Instituições financeiras no Brasil lançam plataformas destinadas à negociação
Lucas Bombana
São Paulo
O inverno cripto atravessado pelo Bitcoin e por seus pares durante os últimos meses não tem atrapalhado os planos de empresas do mercado financeiro de lançarem plataformas destinadas à negociação de criptomoedas, e tampouco esfriado a demanda dos clientes.
Nubank, BTG Pactual e XP Investimentos anunciaram recentemente o início da oferta de serviços relacionados ao mercado cripto, e grandes bancos, como Santander e Itaú, criaram ou planejam iniciativas na área.
A aposta no potencial disruptivo do universo cripto no médio e longo prazo faz com que empresas e investidores pessoa física não se sintam desencorajados pela forte correção de preços verificada recentemente —a principal criptomoeda do mercado acumula desvalorização de cerca de 56% em 2022, até 26 de agosto— em um contexto de alta dos juros nos mercados desenvolvidos.
Prova da demanda que permanece aquecida pelo universo cripto pode ser tirada pelos clientes do Nubank.
A fintech anunciou no final de julho ter alcançado um milhão de clientes em sua plataforma destinada à compra das criptomoedas Bitcoin e Ethereum, apenas três semanas após ter disponibilizado a ferramenta para toda a sua base de clientes. O aporte mínimo começa a partir de R$ 1,00.
\”A volatilidade das criptomoedas não está diretamente associada às perspectivas futuras da tecnologia. O Nubank acredita no potencial disruptivo do mercado de criptomoedas e estamos pensando no longo prazo a partir da constatação de que boa parte de nossos clientes se interessa pelo assunto\”, diz Thomaz Fortes, líder do Nubank Cripto.
Fortes afirma ser difícil prever desempenhos futuros, além de retornos passados não serem garantia de retornos futuros, mas acrescenta que o principal ponto a se destacar em torno do mercado de cripto é o potencial disruptivo da tecnologia que existe por trás, algo que, em sua avaliação, transcende a volatilidade dos preços.
\”Isso por si só já mobiliza entusiastas e a adoção em massa em todos os cantos do mundo, se apresentando como tendência e cuja utilização vem sendo estudada ou implementada em diversos segmentos, como o bilionário mercado de games, por exemplo\”, diz o executivo.
Potencial de mudar os rumos da indústria financeira, diz BTG
No BTG, a oferta de criptomoedas começou no último dia 16 de agosto, por meio do lançamento da plataforma de criptoativos Mynt.
Estão disponíveis na Mynt as criptomoedas Bitcoin, Ether, Solana, Polkadot e Cardano, com aporte mínimo de R$ 100.
Chefe da área de \”digital assets\” do BTG Pactual, Andre Portilho afirma que a seleção das cripto ofertadas considerou, em primeiro lugar, a relevância do Bitcoin dentro do ecossistema, e, no caso das outras quatro, a seriedade no desenvolvimento dos projetos e o potencial de criação de novos negócios permitido por meio dessas plataformas.
\”O potencial que vemos para o futuro da tecnologia cripto é o de mudar os trilhos por onde caminham as transações da indústria financeira, e, eventualmente, de outras indústrias também\”, afirma Portilho.
Ele diz que é preciso separar a volatilidade nos preços dos mercados, influenciada por fatores macroeconômicos alheios ao universo das criptomoedas, como os juros nos EUA, do potencial que a tecnologia poderá trazer como meio de desintermediação das negociações financeiras.
O executivo acrescenta que o BTG foi o primeiro banco do país a \”tokenizar\” uma carteira de ativos imobiliários e distribuir os ativos digitais aos investidores, em meados de 2019, e que o lançamento da Mynt é um passo natural dentro do processo de evolução da operação.
\”A gente acredita que tem uma demanda por essa nova classe de ativo, e que tem uma demanda para fazer isso por meio de plataformas mais conhecidas\”, diz Portilho.
Genial tem planos de lançar plataforma cripto em setembro
Na esteira dos lançamentos recentes no mercado local, a Genial Investimentos também tem planos de lançar, em meados de setembro, uma ferramenta dentro do aplicativo da corretora para oferecer aos clientes a negociação de criptomoedas.
\”Percebemos uma demanda dos clientes e entendemos que conseguimos atender muito bem o público que está em busca desses produtos no país\”, diz Rodrigo Haluska, sócio e diretor de negociação eletrônica da Genial.
Haluska afirma que tanto a economia, como também os mercados de um modo geral, são marcados por grandes ciclos, seja de alta ou de baixa.
E, embora estejamos ainda no meio do inverno cripto, sem previsão de uma virada tão cedo, a visão da corretora é a de que, sob uma perspectiva de médio e longo prazo, o nicho de mercado ainda tem um potencial extraordinário a ser aproveitado.
\”Já temos trabalhado no projeto há quase um ano, antes desse inverno, como o pessoal tem chamado, e a gente acha que é um momento de oportunidade\”, diz.
O sócio da Genial prefere não abrir ainda quais serão os ativos digitais a serem disponibilizados pela plataforma cripto, mas afirma que o segmento é muito mais amplo do que as criptomoedas, e inclui todas as possibilidades oferecidas pela rede blockchain de transformar praticamente qualquer ativo financeiro em um ativo digital dentro do ecossistema.
Nessa linha, o Itaú anunciou em 14 de julho o lançamento da sua divisão de \”digital assets\”, cuja proposta é justamente se valer do potencial da rede blockchain para transformar ativos tradicionais do mercado em ativos digitais, para, dessa forma, torná-los mais acessíveis ao maior número possível de clientes.
Já o presidente do Santander, Mário Leão, afirmou estar nos planos do banco espanhol lançar nos próximos meses alguma ferramenta que dê aos clientes a opção de negociar criptomoedas.
O sócio da Genial diz ainda que a estimativa é ter entre 10% e 20% do total da base de aproximadamente um milhão de clientes operando criptoativos pela plataforma da corretora durante os próximos meses.
Analista recomenda 2% de exposição da carteira às criptomoedas
Especialista em criptomoedas na empresa de análise de investimentos Nord Research, Luiz Pedro Andrade diz que as novas plataformas que têm chegado ao mercado podem ser uma boa alternativa para aqueles que já são clientes das instituições responsáveis pelas ferramentas e que têm interesse em dar o primeiro passo no mercado cripto.
Ele ressalta, contudo, que as perspectivas de curto prazo seguem incertas para as criptomoedas, em um cenário de alta dos juros e risco de recessão nos mercados desenvolvidos.
Até por conta disso, a recomendação do analista é que a alocação dentro de uma carteira de investimentos não ultrapasse os 2% em criptomoedas.
Além disso, ele diz que o investimento não deve ser feito todo de uma vez, mas preferencialmente através de algumas alocações em separado, de modo a diluir o risco de colocar o dinheiro às vésperas de um ajuste mais agudo no mercado e perder a oportunidade de comprar a preços mais convidativos.
\”Acho que a queda recente representa um bom momento para quem estiver interessado em começar a investir, mas sempre com muita parcimônia e uma gestão de risco bem definida\”, afirma Andrade.
Fonte: Folha de São Paulo