Governo edita portaria para renegociar dívidas de empresas do Simples, mas medida é insuficiente
Empresas precisam de mais prazo para regularizar débitos, e Congresso segue determinado a derrubar veto do Refis
O governo Jair Bolsonaro (PL) editou nesta terça-feira (11) uma portaria para renegociar dívidas de empresas do Simples Nacional com a PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional).
A medida é uma tentativa do presidente de acenar às micro e pequenas empresas após ter vetado —a contragosto— um projeto que abriria uma ampla negociação de dívidas desse público.
Fontes do governo admitem, porém, que a portaria é pouco eficaz para equacionar o problema. A medida alcança apenas os débitos já inscritos na dívida ativa da União, sem incluir aqueles em fase administrativa de cobrança pela Receita Federal.
O veto ao Refis do Simples Nacional abriu uma crise dentro do governo e irritou o Congresso Nacional, onde lideranças haviam dado amplo apoio à medida.
O próprio presidente vem dizendo em entrevistas que o embate entre as equipes política e econômica gerou mal-estar no governo.
\”Fui obrigado a vetar a renegociação das dívidas das pequenas e microempresas. Isso logicamente teve um estresse entre eu e a equipe econômica, no bom sentido\”, afirmou Bolsonaro, na segunda-feira (10). Dias antes, chegou a dizer que a pasta de Paulo Guedes \”deixa a desejar\”.
Desde o veto, Bolsonaro ordenou a seus auxiliares que encontrem uma solução para as dívidas das empresas menores. Na segunda-feira, após conversa com Paulo Guedes, o presidente anunciou que haveria uma portaria para tratar da questão, mas não deu detalhes.
A edição portaria da transação tributária —como é chamada essa modalidade de negociação— já vinha sendo cogitada desde a semana passada, mas acabou tendo poucos avanços desde então.
A Folha apurou que, até a manhã desta terça-feira, não havia nenhum ato concluído para publicação. Os técnicos foram convocados de última hora para fechar os detalhes da medida, publicada em edição extra do Diário Oficial da União.
Segundo a portaria, as empresas do Simples Nacional terão até 31 de março para aderir à negociação. Quem optar pela modalidade precisará pagar uma entrada equivalente a 1% do valor negociado, em até oito parcelas.
O saldo restante da dívida deverá ser quitado em até 137 prestações, com descontos de até 100% em juros, multas e encargos. O abatimento, porém, não pode ser maior que 70% do valor total da dívida (principal mais as correções).
Na transação tributária, o valor do desconto é definido caso a caso pela PGFN, de acordo com a capacidade de pagamento do devedor. A mesma lógica será aplicada no caso da portaria focada nas empresas do Simples Nacional.
Caso a empresa tenha tido perdas durante a crise provocada pela pandemia da Covid-19, isso será computado como um redutor da capacidade de pagamento da companhia.
Há ainda a possibilidade de aderir à transação de pequeno valor (para débitos de até R$ 72.720), com entrada de 1% e descontos de até 50%, conforme o prazo escolhido para pagamento.
Segundo o Ministério da Economia, 1,8 milhão de empresas estão inscritas na dívida ativa da União por débitos do Simples Nacional, das quais 160 mil são microempreendedores individuais (MEIs). O valor total dos débitos é de R$ 137,2 bilhões.
O deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP), que foi o relator do Refis do Simples na Câmara, afirmou que a portaria é uma tentativa do governo de amenizar o mal-estar provocado pelo veto. \”Esta portaria minimiza [o problema] e oferece uma alternativa. Mas não é abrangente como o Refis\”, disse.
Segundo Bertaiolli, o ato da PGFN não tira a disposição do Congresso Nacional em derrubar o veto presidencial. \”Vamos derrubar\”, assegurou.
Fontes da área econômica relataram à Folha que ainda há outro problema a ser resolvido e que não é alvo da portaria: o risco de exclusão de empresas do regime do Simples devido à existência de débitos tributários.
O governo estuda a prorrogação do prazo para a regularização desses débitos, para 31 de março ou 29 de abril, dando tempo para que o Congresso reverta o veto ao Refis. A derrubada do veto tem sido defendida pelo próprio presidente da República.
Para essa prorrogação, é necessária a aprovação de uma resolução pelo Comitê Gestor do Simples Nacional, formado por representantes do governo federal, de estados, de municípios e do Sebrae. O mesmo expediente já foi adotado em outros anos.
Um prazo maior de regularização ajuda as empresas porque afasta o risco de elas serem excluídas após optarem pelo regime simplificado. Hoje, as duas etapas —opção e regularização— precisam ser cumpridas até 31 de janeiro.
O autor da proposta do Refis, vice-líder do governo no Senado, Jorginho Mello (PL-SC), disse que agora está tudo resolvido, contando com a derrubada do veto na volta dos trabalhos legislativos.
\”Mantém a derrubada do veto mesmo com a portaria, claro, normal. A portaria era o que precisava ser feito e agora está tudo certo, falei com o presidente, [com] Guedes\”, disse à Folha.
Segundo Mello, o Comitê Gestor do Simples já está preparando a resolução necessária para a prorrogação do prazo de regularização.
Fonte: Folha de São Paulo