Toffoli propõe que plataformas sejam punidas se não removerem conteúdos após notificação de usuários
Primeiro a votar no julgamento sobre a responsabilização civil das plataformas por conteúdos publicados pelos usuários, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu nesta quarta-feira, 4, a punição dessas empresas por publicações criminosas, mas sinalizou que vai propor regras segmentadas para regulamentar suas obrigações. A ideia é fazer uma distinção entre as diferentes plataformas, segundo as atividades exercidas. Ele ainda não concluiu a leitura do voto, que será retomado na quinta.
Uma das diferenciações do voto deve ser entre grupos públicos e canais abertos em aplicativos de mensagens e conversas privadas. O ministro também confirmou que vai excluir plataformas e blogs jornalísticos do julgamento. Nesses casos, segundo propõe Toffoli, deve valer a Lei de Imprensa.
“As responsabilidades desses variados serviços de internet devem ser diferenciadas de acordo com a sua atuação propositiva ou omissiva que possa ensejar a incidência de algum ilícito”, explicou o ministro.
O julgamento gira em torno do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que proíbe a responsabilização das plataformas por conteúdos publicados pelos usuários, exceto se houver descumprimento de decisões judiciais para remover publicações.
Para Toffoli, a restrição é inconstitucional porque deixa os usuários desprotegidos em um contexto de escalada de casos de violência digital, como cyberbullying, stalking, fraudes e golpes, discurso de ódio e fake news.
O Supremo Tribunal Federal é enfático quanto à necessidade de proteger o pluralismo de ideias e opiniões, mesmo que divergentes, antagônicas e minoritárias, a fim de manter condições adequadas e saudáveis do funcionamento do regime democrático. O que não dá é para proteger o crime, o ilícito”, disse.
Ele propõe que os provedores de internet sejam obrigados a remover conteúdos que violem direitos fundamentais após receberem notificações dos usuários ou de seus representantes legais, sem necessidade de decisão judicial.
O ministro defendeu, em diversos momentos do voto, que as plataformas dispõem de ferramentas para identificar e remover prontamente publicações irregulares. “Os algoritmos que conseguem identificar nossas preferências também poderiam identificar as inverdades”, afirmou.
Atualmente, o sistema de remoção imediata de publicações é usado pelas redes sociais para combater a pornografia infantil, a pedofilia e a violação de direitos autorais.
Um argumento central do voto de Dias Toffoli é o de que as plataformas, provedores e redes sociais não são neutros e influenciam o fluxo de informação nos seus ecossistemas.
Os provedores de internet lucram com a disseminação de conteúdo ofensivo, desinformativo e sensacionalista, sendo este, ao que parece, o estímulo maior da sua atuação negligente”, criticou o ministro.
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“A isenção de responsabilidade só estaria presente caso os provedores atuassem de forma neutra, no sentido de que sua conduta fosse meramente técnica, automática e passiva em relação ao conteúdos de seus usuários”, completou.
A tendência é que o STF faça mudanças nas regras atuais do Marco Civil da Internet, ampliando as obrigações das big techs. Para alguns ministros, a obrigação de remover perfis falsos sem necessidade de ordem judicial é menos controversa, embora demande um papel mais ativo das redes sociais em verificar a autenticidade das contas. O tema da remoção de conteúdos específicos a partir de deliberação extrajudicial, no entanto, é considerado mais espinhoso.
Advogados do Facebook e do Googleapresentaram seus argumentos a favor das regras como estão. As empresas consideram uma “armadilha” receber a responsabilidade pelo que publicam os usuários. Essas plataformas projetam que a mudança criaria incentivos à remoção automática de publicações controversas e, em última instância, à censura prévia nas redes sociais. Uma das preocupações é diferenciar, na prática, o que é reprovável do que é criminoso, o que vai além dos termos de uso contratuais.
Quando o Marco Civil da Internet foi aprovado, há dez anos, essa foi a visão dominante no Congresso. Havia um receio em torno dos efeitos que a responsabilização das plataformas, antes de decisão judicial, poderia causar. O Poder Judiciário foi alçado a árbitro das redes justamente para evitar que provedores fizessem juízo de valor sobre publicações. Parlamentares viam com desconfiança o empoderamento das empresas de tecnologia e projetavam um risco de censura colateral.
O ministro Dias Toffoli afirmou que as plataformas já vêm fazendo a moderação de conteúdos ao seu “bel prazer”. “Elas censuram quando bem entendem o que elas entendem, especialmente aquilo que não lhe dá retorno.” O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, espera concluir o julgamento ainda neste ano, antes do recesso, mas há chance de a votação ficar pendente para 2025.
Fonte: Estadão