Toffoli vota para que quem já recebeu revisão da vida toda na Justiça não precise devolver

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu uma terceira via no julgamento dos embargos de declaração que afetam os processos já em andamento na revisão da vida toda. O ministro seguiu o entendimento do relator, ministro Nunes Marques, para não reconhecer a legitimidade do embargo oposto pelo Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev) e rejeitar o embargo oposto pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM), mas propôs modular os efeitos para assegurar que o aposentado que já recebeu valores da revisão da vida toda na Justiça não tenha que devolver os valores. Leia a íntegra do voto.

De acordo com o voto de Toffoli, o direito à verba ficaria assegurado “até a data da publicação da ata de julgamento das ações diretas, 5 de abril de 2024, uma vez que tais valores configuram verba alimentar e que os segurados, autorizados a percebê- los por decisões judicias, gozavam de boa-fé”. Com isso, o INSS ficaria impedido de ajuizar ações rescisórias contra os segurados.

É a primeira vez que o tema é abordado no Supremo. Para o ministro, não há vedação para que o Tribunal, verificando a incidência dos pressupostos legais, efetue a modulação de seu entendimento. Ele afirma que a Corte está diante um caso de “overruling a demandar o resguardo pela Corte de certas situações, sob pena de se configurarem injustiças contra os segurados do Regime Geral que se viram beneficiados por essas decisões, ainda que em menor extensão do que pleiteado nos autos”.

Toffoli endossa o argumento de Nunes Marques, no sentido de que o reconhecimento da constitucionalidade do art. 3º da Lei 9.876/99 superou a tese firmada na revisão da vida toda. Até o momento, acompanharam o relator os ministros Flávio DinoCristiano ZaninCármen Lúcia, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.

Divergiu o ministro Alexandre de Moraes, que votou por dar provimento aos embargos da CNTM. O ministro reconhece que há uma intersecção entre os dois casos, mas afirma que “a constitucionalidade do art. 3º da Lei 9.876/99 pode ficar reconhecida, por meio de uma interpretação conforme à constituição, sem que isso implique qualquer alteração da tese fixada no tema 1.102 da Repercussão Geral”. O voto de Moraes foi acompanhado pelo ministro Edson Fachin.

O julgamento dos embargos nas ADI 2.110 e ADI 2.111 segue em sessão virtual até as 23h59 de 27 de setembro.

Entenda a revisão da vida toda

O processo conhecido como revisão da vida toda permitia a aposentados segurados pelo INSS recalcular o benefício, incluindo, na composição da média salarial, contribuições previdenciárias realizadas antes de julho de 1994. Isso porque, em 1999, uma reforma na legislação previdenciária mudou as fórmulas de cálculo dos benefícios e definiu que, para pessoas que já contribuíam com o INSS naquela época, os pagamentos antes do Plano Real (1994) não seriam considerados. A revisão da vida toda, então, permitia ao aposentado escolher o cálculo que melhor se fosse favorável.

Essa possibilidade foi validada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e depois pelo STF. No entanto, em novembro do ano passado, no julgamento dos embargos de declaração opostos pelo INSS no Recurso Extraordinário 1.276.977, que pediam a nulidade do processo ou a modulação de seus efeitos, o ministro Cristano Zanin apresentou um voto na contramão de seu antecessor, o ministro hoje aposentado Ricardo Lewandowski. Zanin considerou que o julgamento no STJ não respeitou o art. 97 da Constituição que exigia reserva de plenário e votou por anular o acórdão.

No caso, a decisão que validou a revisão da vida toda era oriunda da Primeira Seção do STJ. A cláusula de reserva de plenário é uma regra segundo a qual as Cortes só poderão declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou norma pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos integrantes do órgão especial.

Já em março deste ano, o presidente do Tribunal, ministro Luís Roberto Barroso colocou em pauta a ADI 2.110 e a ADI 2.111, que contestavam a validade do artigo 3º da Lei 9.876/99, que trata sobre regra de transição a ser usada para os cálculos de aposentadoria. A mesma legislação em questão no caso da revisão da vida toda. Neste julgamento, os magistrados derrubaram a tese da revisão da vida toda.

Ao julgarem que a regra é válida e cogente, não é possível que o aposentado escolha o melhor cálculo para ele. Na prática, esse julgamento reverteu a vitória dos aposentados. No julgamento, prevaleceu o voto do ministro Cristiano Zanin. Ele argumentou que há uma liminar nas ADIs a favor da constitucionalidade da lei há mais de 20 anos, portanto, a regra de transição deve prevalecer e não há possibilidade de escolha. Foi, então, fixada a seguinte tese: “A declaração de constitucionalidade do artigo 3º da lei 9876, de 1999, impõe que o dispositivo legal seja observado de forma cogente pelos demais órgãos do poder judiciário e pela administração pública, em sua interpretação literal, que não permite exceção: o segurado do INSS que se enquadra no dispositivo, não pode optar pela regra definitiva, independente de lhe ser mais favorável”.

Acompanharam Zanin os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. O ministro Nunes Marques, relator da ADI, mudou o voto no fim da sessão e acompanhou Zanin. O resultado do julgamento foi considerado uma vitória para a União, que temia impacto no orçamento. Primeiro, o INSS havia afirmado que o impacto seria de R$ 46 bilhões, depois, o então Ministério da Economia, subiu para R$ 360 bilhões e no início deste ano foi projetado em R$ 480 bilhões. Porém, associações de aposentados contestam a cifra e trazem valores de R$ 3 bilhões de impacto em 10 anos. Para as associações, os valores levantados pela União foram inflados.


Fonte: JOTA

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