Governo busca acordo para desoneração e estuda renegociar dívidas municipais
Planalto quer solução para o tema até a Marcha dos Prefeitos, em 20 de maio, em Brasília
Catia Seabra Julia Chaib Victoria Azevedo
Brasília
O governo Lula (PT) quer encontrar em menos de um mês uma solução para o impasse com municípios em torno da reoneração da folha de pagamentos. O objetivo é resolver o tema até 20 de maio, quando começará em Brasília a Marcha dos Prefeitos.
Enquanto uma ala do governo propõe uma progressão da contribuição previdenciária dos municípios conforme a arrecadação, a equipe econômica tem defendido manter a reoneração e oferecer em contrapartida uma renegociação das dívidas das prefeituras com a União.
Essa proposta teria sido apresentada pelo presidente da CNM (Confederação Nacional dos Municípios), Paulo Roberto Ziulkoski, e conta com a simpatia da Fazenda. Mas outras associações têm apresentado contrapropostas.
O aceno aos prefeitos também serviria para aliviar o ambiente político no ano de eleições municipais.
Defensores de uma solução política para o imbróglio, aliados do presidente, no entanto, vão enfrentar dificuldades no Congresso Nacional. A tentativa de negociar com os prefeitos e também com o Congresso ocorrerá em paralelo a um novo foco de tensão entre os Poderes.
A AGU (Advocacia-Geral da União) entrou na quarta-feira (24) com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para suspender trechos da lei aprovada pelo Congresso que prorrogava até 2027 a desoneração da folha de pagamentos das prefeituras e de 17 setores da economia. O pedido foi acatado de forma monocrática pelo ministro Cristiano Zanin, com efeito imediato.
A atitude de acionar o Judiciário desagradou aos prefeitos, que contam com o corte na alíquota para ter mais dinheiro em caixa sobretudo em ano de eleições municipais. Também irritou os parlamentares, que viram a medida como uma interferência em decisões do Legislativo.
Lula, porém, quer ter uma resposta para dar aos chefes dos Executivos municipais que viajarão a Brasília para o evento anual da CNM. Até lá, será estudada uma proposta voltada às prefeituras em consonância entre a equipe econômica e a ala política do governo.
O secretário especial de Assuntos Federativos do governo, André Ceciliano, tem se reunido com representantes de prefeitos em busca de uma saída consensual. Segundo ele, estão sendo discutidas diferentes ideias. Uma delas fixa um escalonamento a partir de uma alíquota de contribuição previdenciária de 8%.
Mas o governo trabalha com uma progressão de índices que vão de 10% a 20%. “Quem tem menor receita corrente líquida paga menos”, diz Ceciliano.
Uma ideia na mesa é incluir a solução que for negociada em um projeto de lei de autoria do deputado José Guimarães (PT), líder do governo na Câmara.
Um cardeal do centrão diz que é necessário dar uma resposta à insatisfação política com o tema. Segundo ele, há uma discussão entre líderes para acelerar a tramitação de algum projeto que trate da desoneração —um que já tenha sido apresentado ou até mesmo um novo texto.
Ele diz que poderá ser votado um requerimento de urgência (que acelera o trâmite de matérias na Casa) na segunda semana de maio para, em seguida, aprovar a matéria.
Já deputados governistas dizem que o Executivo tem que usar os instrumentos que pode para tentar conter as despesas e que cabe também ao Congresso ter responsabilidade com as contas públicas do país.
Um líder da base aliada do petista diz que espera que as queixas diminuam até a Câmara retomar os trabalhos —não haverá sessões nesta semana devido a acordo firmado entre o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e líderes, em razão do Dia do Trabalhador.
Os ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Flávio Dino, e Edson Fachin, do Supremo, votaram para confirmar a decisão de Zanin de suspender trechos da lei que prorrogou a desoneração da folha de empresas e prefeituras. O julgamento foi interrompido na sexta-feira (26) após pedido de vista do ministro Luiz Fux.
Os magistrados, porém, podem continuar votando até 6 de maio, quando acaba o julgamento no plenário virtual, o que pode formar uma maioria pró-tese do governo.
O governo não pretende recuar da ação no STF, que provocou novos atritos com o Congresso, mas quer reunir os parlamentares em busca de uma solução para o problema.
Lula queria ter conversado com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), nesta semana. O encontro, no entanto, acabou adiado. O presidente tentará se reunir com o senador na próxima semana e aproveitará para discutir a questão da desoneração.
Pacheco verbalizou na sexta o incômodo dos parlamentares com a posição do governo. Ele criticou o governo e chamou a ação da AGU (Advocacia-Geral da União) —que representa a União— de “catastrófica”.
O senador disse que o Congresso foi surpreendido com a decisão do governo federal de acionar o Judiciário e que o erro foi não só técnico mas também político.
Segundo admitem aliados de Lula, Pacheco não foi comunicado por Haddad de que a ação seria protocolada na quarta.
Embora Haddad já houvesse anunciado a intenção de entrar na Justiça, o presidente do Senado teria ficado contrariado por não ter sido avisado. A ação foi protocolada em paralelo à articulação da entrega de projetos para regulamentar a reforma tributária.
Parlamentares criticaram duramente a decisão do governo, afirmando que foi um desrespeito com o que foi deliberado pelo Congresso.
A desoneração da folha foi criada em 2011, na gestão Dilma Rousseff (PT), e prorrogada sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.
No ano passado, o benefício havia sido prorrogado até o fim de 2027 e estendido às prefeituras. Mas o texto aprovado pelo Congresso foi vetado na totalidade por Lula. Em dezembro do mesmo ano, o Legislativo derrubou o veto. A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
Fonte: Folha de São Paulo