Governo Lula propõe corrigir FGTS pela inflação e ignora retroativos

Acordo entre Ministério do Trabalho e centrais sindicais atende parte de pedido em ação a ser julgada no STF

Renato Machado Cristiane Gercina

Brasília e São Paulo

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) propôs ao STF (Supremo Tribunal Federal) a correção dos valores do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), no mínimo, pela inflação.

A proposta atende a parte do pedido feito na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5.090, que discute a remuneração do fundo na corte. O julgamento do caso estava pautado para esta quinta-feira (4), mas não ocorreu, e deverá ficar para os próximos dias.

Pela solução encaminhada em manifestação nesta quinta, a AGU (Advocacia-Geral da União) propõe correção de 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial), e distribuição do lucro, “com efeitos prospectivos”, ou seja, futuros. Hoje, o fundo rende 3% ao ano mais TR, que tem ficado próxima de zero.

Foi acrescentado ainda um mecanismo para contornar eventuais perdas. Nos anos em que a remuneração não alcançar a inflação, caberá ao conselho curador do FGTS determinar a forma de compensação.

A proposta do governo faz parte de um consenso entre o Ministério do Trabalho e Emprego e as centrais sindicais, mas não contempla o pagamento dos valores retroativos e não atende ao pedido principal dos trabalhadores, que é afastar o uso da TR.

O STF começou a julgar o caso no ano passado, mas o julgamento foi interrompido. A ação chegou à corte em 2014, levada pelo partido Solidariedade. Nela, pede-se que a TR seja considerada inconstitucional e a Justiça adote algum índice de inflação, que pode ser o IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial) ou o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).

Essa seria a solução para repor as perdas dos trabalhadores, calculadas em 90% entre 1999 —quando houve alteração no FGTS— e 2013, data de estudo encomendado pela Força Sindical.

Em nota, o governo confirma que a proposta é fruto de um consenso com as centrais e que o conteúdo busca “harmonizar” os interesses dos trabalhadores com as demais funções do Fundo. Ao STF, a AGU diz que uma nova reunião com os representantes dos trabalhadores está marcada para 8 de abril.

O governo Lula ainda acrescenta que a falta de alternativas para os casos passados se deve à avaliação de que isso deveria ser feito por intermédio de uma medida legislativa ou então por meio de negociação.

“Até o presente momento, ressalta o documento [da AGU], o consenso entre as partes é restrito à forma de remuneração do FGTS em seus efeitos futuros, não abrangendo, portanto, os valores retroativos”, diz o documento.

“Para esses últimos, a AGU recorda o voto já apresentado pelo ministro relator da ADI [Luís Roberto Barroso], e acompanhado pelos ministros André Mendonça e Nunes Marques, remete à via legislativa ou negociação entre as entidades de trabalhadores e o Poder Executivo”, afirma o governo, em nota.

Mario Avelino, presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador, diz que a proposta do governo não acrescenta em nada o que já é garantido aos profissionais no que diz respeito à correção do FGTS.

“A lei garante a distribuição do lucro e, desde 2021, o governo tem distribuído praticamente quase 100% dos resultados”, afirma.

Para ele, o Supremo tem sido incoerente ao julgar a remuneração do Fundo de Garantia. “A TR foi considerada inconstitucional em 2013, quando o Supremo derrubou o uso nos precatórios. Em 2020, derrubou a TR nas ações trabalhistas. Como ONG, somos totalmente contrários ao voto do Barroso.”

O governo Lula trabalhou no ano passado por uma paralisação do julgamento, por causa do seu impacto financeiro. Indicado pelo mandatário para uma vaga na Corte, o ministro Cristiano Zanin pediu vistas em novembro de 2023 e assim interrompeu a análise. Zanin devolveu o caso ao STF em 25 de março.

A proposta do governo já sinalizada que a intenção era garantir pelo menos a inflação para os valores depositados no fundo. O problema sempre esteve na correção dos valores retroativos, um desejo dos representantes dos trabalhadores, mas que o governo federal queria evitar.

Para as centrais, o pagamento dos retroativos poderia ser parcelado, o que aliviaria parte das dificuldades do governo.

Desde 2017, a Caixa distribui parte dos resultados do FGTS aos trabalhadores, elevando a remuneração do dinheiro dos cidadãos no fundo. O percentual, porém, não é fixo e é determinado pelo Conselho Curador do FGTS.No ano passado, foi distribuído 99% do lucro, em um total de R$ 12,719 bilhões creditados na conta dos trabalhadores.


Fonte: Folha de São Paulo

Traduzir »