iFood diz que proposta do governo deixa 93% dos entregadores fora da previdência

Governo pressupõe contribuição mínima de R$ 105 por entregador; aplicativo prevê que eles terão de dobrar horas trabalhadas para terem cobertura

Se a alíquota previdenciária para aplicativos como iFood e Rappi for a mesma que a do Uber e do 99, os entregadores terão que trabalhar mais do que o dobro para terem direito à aposentadoria.

Nesta segunda (4), o presidente Lula enviou ao Congresso um projeto de lei que estabelece o recolhimento de 25% da renda bruta dos motoristas e entregadores de aplicativos para o INSS, sendo 20% da contribuição por parte das empresas e 7,5% descontado dos trabalhadores.

Segundo Lucas Pittioni, vice-presidente jurídico e de políticas públicas do iFood, mantido esse critério, somente cerca de 7% dos entregadores terão acesso à seguridade social. Os demais (93%) teriam de desembolsar valores para alcançar o mínimo de R$ 105 exigido como piso do recolhimento mensal para ter cobertura.

“É uma proposta que desagrada a plataforma, porque ela aumenta drasticamente o custo da operação sem trazer nenhuma contrapartida”, disse Pittioni ao Painel S.A.. “E ela desagrada igualmente o trabalhador, porque ele não vai pagar essa quantia para o governo e não ser efetivamente incluído na previdência. Vamos seguir defendendo que existem modelos mais adequados.”

Dados do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) indicam que entregadores trabalham entre 13 e 17 horas por semana —o número desconsidera o conceito de hora logada, no qual basta a pessoa precisa estar conectada à plataforma.

Com base nesses dados, o iFood projetou que, para atender à proposta do governo, os entregadores teriam de dobrar as horas de trabalho semanais para arcar com sua cota de contribuição.

No caso da Uber e do 99, cujas corridas geram mais receitas, o impacto não seria tão significativo.

Esse foi um dos motivos que deixou os entregadores fora do projeto, pois não houve acordo entre lideranças trabalhistas, governo e empresas. A expectativa é a de que o assunto seja retomado nas próximas semanas.

Flexibilização

O iFood rejeita a proposta previdenciária do governo. A alternativa levada pela empresa ao Ministério do Trabalho é a de criar uma tabela progressiva. Por ela, haveria uma alíquota determinada a partir da renda gerada pelo trabalhador com as entregas.

Da forma como está, a plataforma afirma que o governo vai aumentar a arrecadação com o INSS, mas não vai promover a inclusão dos trabalhadores no regime previdenciário.

O ministério, segundo a companhia, disse não haver espaço no Orçamento para complementar a previdência dos trabalhadores nos moldes de uma tabela progressiva.

Pittioni afirma que a proposta do governo só se sustenta para motoristas de automóveis, porque o número de horas trabalhadas e o valor das viagens são o dobro em relação aos motoboys.

Durante a cerimônia de entrega do projeto de lei que vai discutir a regulamentação dos motoristas por aplicativo, como Uber e 99, Lula cobrou de Fabricio Bloisi, dono do iFood, que negocie um acordo com a categoria.

O iFood nega que tenha deixado de negociar e afirma que houve discordância entre os entregadores —que contam com lideranças pulverizadas— e o próprio governo, que não foi capaz de resolver o impasse.

Remuneração mínima

Além do fator previdenciário, pesaram nas negociações o valor de uma remuneração mínima por hora trabalhada. As empresas e o governo aceitaram o oferecimento de R$ 17 por hora, porém os entregadores recusaram.

Entre as diversas opções levadas ao grupo de trabalho que discutiu uma proposta de regulação ao longo do ano passado, os entregadores pediram R$ 25 por hora trabalhada, valor considerado pelas empresas como fora da realidade. O iFood paga, em média, R$ 23 por hora.

No caso dos motoristas, a média do mercado gira em torno de R$ 40 por hora trabalhada. O mínimo estipulado no projeto que tramita no Congresso é R$ 32, quantia definida sobre um salário mínimo mensal.

Além do custo operacional ser maior, a demanda dos motoristas com passageiros e os valores das viagens são maiores. Neste caso, o desconto com o INSS em 25% estaria dentro dos padrões.

“Pela própria característica do delivery, que acontece muito no almoço, no jantar, e está mais concentrado aos finais de semana, os motoristas acabam trabalhando mais horas e o engajamento é maior, com um ganho nominal maior”, afirma Pittioni.

Com Diego Felix


Fonte: Folha de São Paulo

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