Transparência recebeu US$ 3 milhões da Siemens após corrupção

Envolvida em casos de suborno em diversos países, empresa alemã financiou ONG, hoje na mira de ministro do STF

Brasília

A Transparência Internacional (TI), hoje sob investigação autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, recebeu US$ 3 milhões da Siemens desde 2015, apesar de sua política vetar doações de empresas envolvidas em corrupção.

A multinacional alemã esteve no epicentro de um dos mais escandalosos casos do gênero, envolvendo pagamento de propina a servidores públicos na Itália, Israel, Rússia, China, Noruega e Grécia por contratos. Acertou compensações que totalizaram US$ 1,6 bilhão nos EUA e Alemanha.

Além do patrocínio à ONG, a Siemens contratou uma ex-funcionária da Transparência para montar o seu sistema de integridade.

Nesta segunda (5), a Transparência se tornou alvo de uma investigação autorizada pelo ministro do STF Dias Toffoli.

Em sua decisão, ele considera haver indícios de apropriação indevida de recursos do acordo de leniência firmado em junho de 2017 entre a J&F, holding dos irmãos Batista, e o Ministério Público Federal. No entanto, não há comprovação de pagamentos.

As medidas tomadas por Toffoli geraram polêmica, entre outros motivos, porque a mulher do ministro, Roberta Rangel, é advogada da J&F em um caso de litígio empresarial.

A principal fonte de suspeita sobre a Transparência é que, seis meses antes da assinatura do acordo de leniência, a entidade enviou uma carta ao MPF propondo uma colaboração para orientar a destinação dos recursos a serem pagos pela J&F.

No documento, a Transparência não solicita dinheiro diretamente, mas, supostamente, sinaliza para essa possibilidade ao mencionar que parte dos recursos deveria financiar “ações que tenham grande impacto na proteção, capacitação e provisão de recursos financeiros às organizações e redes de organizações que realizam o controle social da corrupção no país”.

Os valores reservados a compensações somavam R$ 2,3 bilhões à época. A Transparência sustenta que nunca recebeu nenhum tostão do acordo.

Não aceitaríamos dinheiro da J&F”, diz ONG

Consultada, a Transparência disse que opera sob rígidas diretrizes éticas e que sua política de financiamento segue práticas transparentes e responsáveis.

“Por política, nenhum órgão da TI deve aceitar doação de uma empresa envolvida em corrupção, a menos que ela possa demonstrar que isso foi uma violação das políticas da empresa, que a violação dessas políticas está sendo tratada de maneira apropriada para proibir uma violação semelhante no futuro”, disse a TI em nota.

A ONG esclarece que as doações da Siemens foram feitas pela Siemens Integrity Initiative, divisão estabelecida como parte do compromisso global da empresa em abordar questões de corrupção e promover práticas comerciais éticas.

“Esta iniciativa lançou um convite aberto e competitivo para propostas de subvenções de organizações da sociedade civil e a Transparency International foi selecionada com base no mérito da nossa proposta de projeto global.”

No Brasil, a Transparência informa ter recusado “inúmeras ofertas de financiamento de empresas que firmaram acordos de leniência”, incluindo a J&F.

Em vez disso, a TI assinou, em dezembro de 2017, Memorando de Entendimento (MoU) com o Ministério Público Federal (MPF) e a J&F.

“Esse memorando foi tornado público na mesma data da sua assinatura e proibia explicitamente qualquer transferência de fundos para a TI.”

A ONG afirma ainda que não aceitou, nem aceitaria recursos da J&F.

“Agora que o MoU não é mais válido, nem a J&F, nem a JBS, companhia sob seu controle, passariam nos requisitos de diligência da TI e, por consequência, não aceitarí

amos nenhum dinheiro vindo deles.” Com Diego Felix


Fonte: Folha de São Paulo

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