Congresso derruba veto à desoneração em nova derrota de Lula e Haddad

Ministro da Fazenda chegou a prometer proposta alternativa para evitar revés, mas não entregou

João Gabriel Thaísa Oliveira Thiago Resende

Brasília

O Congresso derrubou, nesta quinta-feira (14), o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto da desoneração da folha de pagamento. Com a decisão, o benefício será prorrogado até dezembro de 2027.

A sessão conjunta de Senado e Câmara foi marcada por derrotas em série do governo petista. Da pauta econômica, foram derrubados vetos do arcabouço fiscal, do Marco das Garantias e do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).

Votaram pela queda do veto à desoneração da folha 60 senadores, e 13 defenderam manter a decisão de Lula. Pela Câmara, foram 378 votos pela derrubada ante 78 deputados a favor do veto.

A medida do presidente colocaria fim ao benefício em 31 de dezembro deste ano. O veto integral à proposta, revelado pelo Painel S.A. no final de novembro, causou revolta entre parlamentares, e a queda já era esperada.

O placar desta quinta-feira voltou a refletir a posição dos congressistas em defesa do projeto. Quando da aprovação, o texto havia recebido o apoio de mais de 400 deputados na Câmara e apoio simbólico no Senado —ou seja, com amplo apoio.

Após a derrubada do veto, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou que o governo vai ao STF (Supremo Tribunal Federal). A ideia é argumentar que a prorrogação do benefício é inconstitucional. “Não existe da nossa parte nenhum ânimo de antagonizar. Nós queremos uma solução”, disse o ministro.

Entre os setores beneficiados está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, entre outros.

O Congresso reestabeleceu ainda o trecho que prevê benefícios para municípios com até 142,6 mil habitantes. O veto de Lula eliminava a redução de 20% para 8% da contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) concedida às prefeituras que não têm regimes próprios de Previdência.

Nas contas do Ministério da Fazenda, o programa custaria R$ 9,4 bilhões anuais aos cofres públicos. Além disso, o benefício para os municípios custaria mais R$ 9 bilhões.

A decisão do governo era defendida por economistas como Samuel Pessôa, Marcos Mendes e Bernardo Guimarães, colunistas da Folha. Para eles, a política não alcançou os resultados almejados de impulsionar a geração de empregos e a economia.

O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), disse que a medida não resolve o problema do emprego e não beneficia a todos os setores.

“Essa medida tem pelo menos dez anos de história. Segundo estudos, não representou concretamente a incorporação e aquisição de empregos novos aos brasileiros”, disse Randolfe.

De acordo com o líder, o Palácio do Planalto insistirá em medidas alternativas para o próximo ano. Haddad chegou a prometer apresentar uma proposta, o que não se confirmou.

Na quarta-feira (13), o autor do projeto da prorrogação da desoneração, senador Efraim Filho (União Brasil-PB), criticou o governo pela forma como lidou com a proposta.

“O governo perdeu a condição de poder impor condições para que se possa derrubar o veto. O governo foi omisso durante dez meses de tramitação do projeto”, afirmou. “A proposta do governo é bem-vinda para que a gente possa avaliar, mas depois de derrubado o veto”, disse.

Nesta quinta, ele voltou a defender sua proposta.

“É um projeto que dialoga com a vida real, é um projeto que é apoiado por quem produz e por quem trabalha. É apoiado pelos setores produtivos e pelos sindicatos. Todos juntos apoiam a desoneração, porque ele gera mensagem de quem gera mais empregos paga menos impostos”, afirmou Efraim.

“Se a gente continuar taxando o emprego, elevando o custo do emprego, tornando mais caro contratar pessoas, qual é a solução que as empresas terão? é substituir o trabalhador”, concluiu o senador.

Os setores beneficiados defendiam em manifesto que a manutenção da desoneração não somente aumentou o emprego formal como também resultou em incremento da competitividade desses setores na economia brasileira. A decisão do Congresso desta quinta levou a repercussões.

O presidente da CSB (Central Sindical Brasileira), Antonio Neto, afirmou, em nota, que “o Congresso Nacional corrigiu uma injustiça que certamente os trabalhadores pagariam a conta. É uma vitória do emprego formal e digno”.

“Os trabalhadores não podem pagar a conta do ajuste fiscal com desemprego e informalidade. Nós continuamos abertos ao diálogo e ouvir as alternativas que o governo diz ter, mas que até agora não apresentou”, disse o sindicalista.

O sistema Sest-Senat (Serviço Social do Transporte e Serviço Nacional do Transporte) afirmou que “a derrubada do veto é um alívio para o transporte rodoviário de cargas, um dos 17 setores desonerados, setor que representou 5,1% do PIB no primeiro trimestre de 2023 e responsável por movimentar mais de 65% de tudo que é produzido no país”.

“Com o veto, havia a preocupação de que as empresas precisam realizar demissões e diminuir os investimentos, realizados desde o início da desoneração da folha de pagamento, em 2011”, afirmaram as entidades.

“O veto foi uma decisão acertada da maioria absoluta dos parlamentares no Senado e na Câmara a favor do emprego e do setor produtivo nacional. Enfim, ganha o Brasil. É uma importante iniciativa que atinge cerca de 9 milhões de trabalhadores”, disse o presidente da Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais), Flávio Roscoei.

Para compensar a prorrogação da desoneração, o projeto também estende, pelo mesmo período, o aumento de 1% na alíquota da Cofins-Importação —pela lei atual o prazo termina em dezembro.

Como mostrou a Folha em outubro, o Ministério da Fazenda já havia avisado o Palácio do Planalto que iria defender o veto total ao projeto.

O argumento era que, desde a reforma da Previdência, ficou vedado adotar medidas que possam reduzir a arrecadação de recursos do fundo que banca as aposentadorias. Por isso, a prorrogação da desoneração seria inconstitucional. Este será o fundamento a ser levado ao STF.

Após a decisão, Haddad chegou a prometer que o governo enviaria uma proposta alternativa à desoneração, o que não foi feito.

Integrantes do governo dizem que Haddad chegou a comentar que havia preparado a solução intermediária e apresentado a alguns setores, mas que a ideia não teria agradado. Segundo quem conversou com o ministro, a sugestão abarcaria um escalonamento da reoneração até 2027.


Fonte: Folha de São Paulo

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