Americanas fecha acordo com bancos para aprovação de plano de recuperação judicial

Instituições representam 35% das dívidas da varejista, que precisa de maioria simples para aprovar proposta; Safra é contra

Júlia Moura Daniele Madureira Stéfanie Rigamonti

São Paulo

A Americanas anunciou nesta segunda-feira (27) que conseguiu o apoio de parte de seus credores para a aprovação do plano de recuperação judicial da companhia, além de uma linha de crédito deste grupo de R$ 1,5 bilhão.

Bradesco, BTG Pactual, Itaú e Santander assinaram o acordo. Eles detêm cerca de 35% da dívida da varejista, que precisa do apoio da maioria simples (50,01%) dos seus credores para aprovar o plano de RJ. O BV (Banco Votorantim) e o Banco do Brasil também já sinalizaram apoio ao acordo, e devem assiná-lo até 19 de dezembro, data da assembleia de credores.

Dentre os maiores credores da companhia, o Safra é o único que demonstra ser contra o acordo. Na última sexta (24), o banco pediu à Americanas acesso aos documentos que embasaram as demonstrações financeiras de 2021 e 2022, apresentadas no último dia 16, para entrar no acordo da varejista com bancos. A Americanas deve cerca de R$ 2,5 bilhões ao Safra, ou seja, o banco tem sozinho 5,9% da dívida total.

“Este acordo é um marco importante de nosso processo de recuperação judicial e um significativo progresso da Americanas no caminho para a nossa meta de emergir como uma empresa mais forte”, disse Leonardo Coelho, presidente da Americanas, em comunicado à imprensa.

Segundo a varejista, há outros interessados em diálogo com a empresa, o que pode elevar o apoio de para mais de 50%.

O Safra, porém, não está facilitando o acordo. No comunicado enviado sexta à diretoria de relações com investidores da Americanas, em que pede acesso aos dados do balanço que indicou prejuízo de R$ 12,9 bilhões em 2022, o banco diz ter “profunda desconfiança” da varejista.

A instituição financeira ficou temerosa com notícias veiculadas pela imprensa, que indicam que as denúncias feitas pelos delatores da fraude de 11 de janeiro, quando vieram à tona as “inconsistências contábeis de R$ 20 bilhões“, teriam sido consideradas para a elaboração das demonstrações financeiras retificadas de 2021 e 2022, “o que indica uma possível fragilidade também desses novos números apresentados”.

Mas a principal questão que acendeu o alerta para o banco foi o fato de que a nova auditoria, a BDO –que atende a empresa desde a saída da PwC, em junho– não validou as demonstrações financeiras, indicando apenas não ter sido possível “obter evidência de auditoria apropriada e suficiente para fundamentar nossa opinião de auditoria sobre essas demonstrações contábeis individuais e consolidadas.”

No mesmo documento enviado na sexta-feira (24), elaborado pelo escritório Warde Advogados, o Safra diz que “o descumprimento da presente solicitação no prazo acima assinalado [de 48 horas] ensejará a tomada, por parte do Safra, de todas as medidas cabíveis para fazer valer sua justa pretensão. Afinal, os credores financeiros, de ora avante, não direcionam mais seus pedidos à Americanas como simples financiadores externos da companhia, mas como possíveis sócios mesmo”, informa o documento.

Procurado, o banco Safra não revelou seus próximos passos. Informou apenas, por meio de sua assessoria de imprensa, que “o acordo proposto [nesta segunda] prevê interrupção das investigações e portanto desconsidera o justo interesse da sociedade e de todos impactados de saber o que ocorreu de verdade. A injeção de recursos não pode desconsiderar o fato de que houve a maior fraude contábil do Brasil e uma das maiores do mundo.”

A assembleia de credores da Americanas para aprovação do plano de recuperação judicial está marcada para 19 de dezembro, último dia útil do Judiciário em 2023. O plano inclui o aumento de capital da companhia via emissões de novas ações. Serão R$ 12 bilhões para os acionistas controladores —Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles— e até R$ 12 bilhões para os bancos, totalizando uma injeção de R$ 24 bilhões na companhia.

A companhia, que tem dívida de R$ 42,5 bilhões, também prevê no plano R$ 2 bilhões para pagamento de credores financeiros por meio de mecanismo de leilão reverso e R$ 6,7 bilhões para aqueles que optarem por receber antecipadamente, mas com forte desconto. Ao final do processo, a Americanas estima que sua dívida bruta será de R$ 1,875 bilhão.

Safra impediu que varejista pagasse credores de menor porte

Para que seu plano de recuperação judicial seja aceito, no entanto, a Americanas precisa da aprovação de credores que representem 50,01% da sua dívida, de R$ 42,5 bilhões. “Para a aprovação do plano, também é necessário que o documento seja aprovado em todas as classes presentes na recuperação judicial. Sendo que na classe trabalhista e na Classe 4 –de micro e pequenas empresas–, a contagem é quantitativa, por credor. Ou seja, nestas classes, precisa de 50% + 1”, diz o advogado Filipe Denki, especialista em recuperação judicial.

No final de fevereiro, o juiz Paulo Assed Estefan, titular da 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, concedeu liminar à Americanas para que a empresa pagasse os débitos trabalhistas e os micro e pequenos fornecedores. Mas uma ação do Safra na Justiça conseguiu suspender, no início de março, o pagamento, que já estava em curso. Hoje, as dívidas trabalhistas e micro e pequenos fornecedores soma R$ 263,1 milhões –ou 0,6% do total.

Nos últimos dias, a divulgação de notícias envolvendo um acordo entre Americanas e credores para injeção de capital na empresa animou o mercado, com a ação subindo 18% em cinco dias. Nesta segunda, após a divulgação do acordo vinculante com credores que detêm 35% das dívidas da empresa, os papéis da varejista chegaram a abrir a sessão na B3 em elevação de 10%, tocando a máxima de R$ 1,23 no dia.

Após os primeiros negócios no dia, contudo, e conforme os operadores digeriram melhor a informação, a ação reverteu o movimento e passou a cair, encerrando o pregão em queda de 5,45%, a R$ R$ 1,04.

No comunicado desta segunda, a Americanas afirmou que conseguiu assegurar na negociação com os credores apoiadores a garantia-firme para uma linha de fianças bancárias de R$ 1,5 bilhão, disponível por dois anos após a homologação do plano de RJ ou enquanto a ela estiver em supervisão judicial. Os credores financeiros que oferecerem esse seguro fiança terão acesso prioritário a uma parcela de R$ 1,5 bilhão do pagamento antecipado dos R$ 6,7 bilhões previsto no plano de RJ.

A Americanas também estipula no plano que a cada três novas ações emitidos, haverá um bônus de subscrição, cujo preço de exercício será de R$ 0,01.


Fonte: Folha de São Paulo

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