Governo vai editar MP com tributação de fundos dos super-ricos e PL sobre offshores
BRASÍLIA – O governo Lula vai editar uma nova Medida Provisória (MP) antecipando para 2023 parte da tributação de fundos exclusivos, também chamados de fundos dos “super-ricos”. O objetivo é que o texto sirva de fonte de compensação para a perda de receitas com o aumento da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda (IR) da Pessoa Física, anunciada pelo presidente em maio.
Essa primeira fase da tributação dos fundos exclusivos vai prever a atualização dos recursos aportados nos fundos com uma alíquota de 10%. Na prática, como é decisão do contribuinte, essa medida escaparia do princípio de anterioridade, previsto na legislação do IR, que exige que medidas de aumento de carga tributária só possam valer no ano seguinte.
O restante das mudanças previstas na tributação desses fundos só poderá ser aplicada em 2024 (leia mais abaixo), caso o Congresso aprove a MP até 31 de dezembro deste ano. Por isso, apenas parte da arrecadação estimada com a medida – R$ 3 bilhões – será usada para compensar a ampliação da faixa de isenção do IR.
O valor remanescente vai reforçar o caixa de 2024 e ser usado para tentar zerar o déficit das contas públicas no Orçamento do ano que vem. O montante total estimado, da nova medida, é de R$ 10 bilhões. Fontes do governo avaliam, no entanto, que a cifra possa chegar a R$ 26 bilhões.
Inicialmente, a ideia era que a compensação do IR fosse feita por meio da taxação de investimentos no exterior, os chamados fundos offshore – que foi acoplada à MP que reajusta o salário mínimo e muda a tabela do IR.
Essa medida, porém, está prestes a perder a validade – 28 de agosto – e gerou um amplo desgaste com o Congresso e com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que alegou que a inclusão do conteúdo não havia sido combinada com as lideranças partidárias.
Para resolver o impasse e evitar que a MP perdesse a validade, colocando em risco as mudanças no reajuste do mínimo e na tabela do IR, interlocutores da Fazenda, da Casa Civil e das Relações Institucionais costuraram nesta terça-feira um acordo com as lideranças da Câmara e do Senado e com os presidentes Arthur Lira e Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O cerne do acordo prevê que o conteúdo da mudança da tributação dos fundos offshore será transferido para um projeto de lei – adiando, portanto, o debate sobre essa taxação, que sofre grande resistência dentro do Congresso. Enquanto que a compensação do IR virá em uma nova MP, antecipando essa primeira “etapa” da mudança na tributação dos fundos exclusivos.
“O Congresso não conseguiu tratar da regulamentação das offshores. Então, as offshores vão para um Projeto de Lei, para que essa agenda da Fazenda siga sendo objeto de discussão”, afirmou o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, atualmente ministro em exercício, uma vez que Fernando Haddad está em viagem na África do Sul.
“Já a MP do salário mínimo, que vai trazer consigo o trecho reajustando a tabela do Imposto de Renda, que é uma boa notícia para a população, que segue com essa garantia de reajuste da tabela, vai ser compensada por uma nova Medida Provisória que trata dos fundos exclusivos no Brasil. Essa era uma medida que a gente já estava prevendo, para fins da lei orçamentária do ano que vem. Então, já existe diálogo instalado sobre isso também. E ela serve de compensação para o IR, então a gente mantém o compromisso fiscal e cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal”.
O envio de um projeto de lei sobre os fundos offshore já tinha sido aventado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ao ser incluída na MP que corrige o salário mínimo, a medida se transformou num cavalo de batalha entre Haddad e Lira. A manobra incomodou a cúpula do Congresso porque foi feita sem acordo prévio.
O problema é que o reajuste da tabela já está valendo, o que aumenta o imbróglio para o governo caso a MP perdesse a validade. Ou seja: a faixa de isenção do IR, atualizada para R$ 2,6 mil em maio por Lula, corria o risco de voltar para R$ 1,9 mil, segundo técnicos ouvidos pelo Estadão. Por isso, o governo resolveu enviar uma nova MP, com uma nova fonte de compensação.
Haddad, que está em viagem à África do Sul, conta com a taxação dos fundos exclusivos e offshore para aumentar a previsão de arrecadação em 2024 e fechar o projeto de Orçamento prevendo um déficit zero – ou seja, zerando o rombo das contas públicas.
Ele pode incluir a previsão de arrecadação no projeto de Orçamento desde que haja uma medida legal em tramitação no Congresso. Depois, a batalha será enfrentar as resistências dos congressistas, sobretudo aqueles que têm investimentos em paraísos fiscais, e aprovar a medida.
Entenda a taxação dos super-ricos
Como regra geral, o ganho de capital das aplicações financeiras no Brasil é tributado com alíquota de 22,5% a 15%, a depender do prazo da aplicação. A alíquota é maior para as aplicações de curto prazo e menor para as de longo prazo.
Os cotistas dos fundos exclusivos pagam 15% porque são investimentos de longo prazo. Mas sobre os fundos exclusivos, na regra atual, não se aplica o chamado come-cota, como ocorre com os demais fundos do mercado.
O come-cotas é o nome dado pelo mercado financeiro ao recolhimento periódico do IR sobre os rendimentos de determinados fundos de investimento. Essa diferenciação na tributação é vista com uma vantagem tributária justamente para os investidores mais ricos do País, que têm acesso a esses fundos exclusivos.
Com a MP, que será publicada pelo governo, haverá incidência do Imposto de Renda pela alíquota de 15% nos fundos fechados. Será dado um prazo de até dois anos para o cotista fazer a regularização pagando essa alíquota.
A diferença é que, se o investidor quiser antecipar o recolhimento do imposto, será dada a opção de pagar o IR com alíquota reduzida de 10% sobre o estoque de rendimentos acumulados no fundo. O prazo de pagamento, porém, será curto para o pagamento. Uma parcela em dezembro e o resto no início de 2024.
Fonte: Estadão