O que é a PEC 110/2019 e o que ela propõe para a reforma tributária?
A PEC 110/2019, que trata da reforma tributária e foi formalmente apresentada pelo senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), tem como objetivo alterar o sistema tributário nacional para simplificar o processo de arrecadação sobre a produção e a comercialização de bens e a prestação de serviços.
Em seu texto original, a PEC 110/2019 propõe a extinção de nove impostos (IPI; IOF; PIS; Pasep; Cofins; CIDE-Combustíveis; Salário-Educação; ICMS e ISS) consolidando as bases tributáveis em dois novos tributos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo.
O IBS segue o modelo do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), adotado em países desenvolvidos. Assim como o IVA, o novo tributo não é cumulativo, ou seja, não incide em cascata em cada etapa da cadeia de produção.
No substitutivo da PEC 110/2019, apresentado pelo então senador Roberto Rocha (PTB-MA), surgiu a proposta de extinção de apenas cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) e a adoção de um modelo de IBS dual, com legislação e administração separadas: o IBS federal (chamado de Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS), que unificaria o Cofins e PIS, e o IBS subnacional, compartilhado pelos estados e municípios, substituindo o ICMS e ISS.
Conforme a proposta, a CBS federal seria instituída por lei complementar, e o IBS subnacional seria instituído pelo Congresso Nacional, com poder de iniciativa reservado aos próprios estados e municípios.
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Aplicado com base no destino final da operação, o tributo será uniforme em todo o território nacional e deve incidir sobre todos os bens e serviços, incluindo operações com bens e direitos, tangíveis e intangíveis, e sobre as importações. As exportações não são tributadas. Segundo o relatório da PEC 110, a alíquota do imposto será única e padrão, mas poderão ser fixadas alíquotas diferenciadas para determinados bens, serviços ou setores da economia e em razão da utilização de novas tecnologias.
PEC 110/2019 e o Imposto Seletivo
No texto original, a PEC 110/2019 define o Imposto Seletivo como um imposto arrecadatório, que seria cobrado sobre operações com petróleo e seus derivados; combustíveis e lubrificantes de qualquer origem; gás natural; cigarros e outros produtos do fumo; energia elétrica; serviços de telecomunicações (referidos no art. 21, XI, da Constituição Federal); bebidas alcoólicas e não alcoólicas; e veículos automotores novos (terrestres, aquáticos e aéreos).
Já no substitutivo, foi adotada uma característica extrafiscal para o Imposto Seletivo, vedada a incidência sobre insumos da cadeia produtiva. O tributo substitui o IPI e seu objetivo é desestimular o consumo de determinados bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas e agrotóxicos. De acordo com a proposta, 20% do produto da arrecadação com o Imposto Seletivo pertenceria aos estados e ao Distrito Federal.
Carga tributária
A PEC 110/2019 mantém a carga tributária atual. A proposta diz que o contribuinte vai pagar o mesmo que já paga hoje, só que de forma simples e transparente.
De acordo com o relatório da PEC 110/2019, a cada dez anos, o Senado Federal reavaliaria a distribuição da carga tributária nacional entre as várias bases de incidência e entre os entes federativos, de forma a tornar o sistema tributário nacional mais progressivo, por meio do aumento proporcional da tributação da renda e do patrimônio.
Caberia ainda aos senadores avaliar a arrecadação dos municípios com mais de 100 mil habitantes e correspondente necessidade de medidas compensatórias, se for o caso.
Partilha da arrecadação do IBS na na PEC 110/2019
O produto da arrecadação do imposto é partilhado entre União, estados, Distrito Federal e municípios mediante entrega de recursos a cada ente federativo conforme aplicação de percentuais previstos na Constituição sobre a receita bruta do IBS.
Transição do sistema tributário
De acordo com o texto original da PEC 110/2019, a transição para o novo sistema tributário seria da seguinte maneira: a partir da publicação da PEC, durante um ano seria cobrada uma contribuição “teste” de 1%, com a mesma base de incidência do IBS, e a transição duraria cinco anos, sendo os atuais tributos substituídos pelos novos na proporção de 1/5 ao ano. Neste período, os entes federativos não podem alterar as alíquotas dos tributos a serem substituídos.
Já segundo o substitutivo da PEC, a fase federal da transição se iniciará no ano seguinte ao ano da publicação da lei complementar instituidora do IBS, caso essa publicação ocorra antes do dia 30 de junho, ou ao ano seguinte, caso ela ocorra após 30 de junho.
O novo texto diz que nos dois primeiros anos de transição federal, a contribuição para o PIS e a Cofins serão substituídas pela alíquota federal do IBS e também haverá a contribuição “teste” de 1% sobre operações com bens e serviços, de acordo com as mesmas regras do IBS estadual, cujo valor pago poderia ser compensado com os valores recolhidos a título de Cofins, preservada a destinação para a seguridade social.
Do terceiro ao sexto ano, as alíquotas do ICMS e do ISS serão gradualmente reduzidas, à razão de 1/5 por ano, até a extinção desses impostos. Concomitantemente, a alíquota estadual e municipal do IBS será elevada de forma a manter o nível de arrecadação das duas esferas federativas. Nesse período, os benefícios fiscais começam a ser reduzidos nesta mesma proporção.
O período de transição da partilha de recursos para os entes federativos era de 15 anos no texto original da PEC 110/2019. O substitutivo adotou um período de transição de 40 anos para os entes federativos, em que nos primeiros 20 anos os estados e municípios terão garantia do valor real da receita com ICMS e ISS e aumento real da receita distribuída pelo destino. Nos 20 anos seguintes, as compensações serão progressivamente reduzidas até que a divisão de arrecadação seja realizada totalmente de acordo com o princípio do destino.
Benefícios fiscais na PEC 110/2019
A PEC 110/2019 autoriza a concessão de benefícios fiscais a pequenas e microempresas, relacionadas ao Simples, e à Zona Franca de Manaus, cujo benefício consistiria num crédito presumido para cobrir as diferenças de custo de logística e transporte dos empreendimentos ali mantidos.
Além disso, por meio de lei complementar operações com alimentos (inclusive os destinados ao consumo animal); medicamentos; transporte público coletivo de passageiros de caráter urbano; bens do ativo imobilizado; saneamento básico; e educação infantil, ensino fundamental, médio e superior e educação profissional poderiam ter tratamento tributário especial.
O substitutivo da PEC ainda acrescentou ao rol de operações que podem ser objeto da concessão de benefícios tributários a cadeia produtiva da saúde; embalagens, resíduos ou remanescentes oriundos de sistema de logística reversa; biocombustíveis; produtos de higiene pessoal; operações de seguro, cosseguro, previdência complementar e capitalização; produtos que originem biocombustíveis, observadas as exigências fixadas em lei; gás de cozinha para uso residencial; produtos para pesquisa e desenvolvimento.
Devolução de tributos
A proposta prevê a devolução de tributos incidentes sobre bens e serviços adquiridos por famílias de baixa renda por meio de mecanismos de cashback.
Devolução de saldos credores
A PEC 110/2019 dá a possibilidade de securitização dos saldos credores, ou seja, permite a troca por títulos emitidos pelo ente, com prazo mínimo de 20 anos e remuneração pela Selic.
Vinculações e partilhas
Segundo a PEC, o produto da arrecadação do imposto é vinculado às despesas e aos fundos mediante aplicação de percentual sobre a arrecadação para definir a entrega direta de recursos (fundos constitucionais, seguro desemprego, BNDES) ou piso mínimo de gastos com saúde e educação.
O texto estipula que a distribuição da cota-parte da parcela estadual do IBS é:
• 60% proporcionalmente à população
• 35% por lei estadual
• 5% em montantes iguais para os municípios do estado
Mudanças previstas na PEC 110/2019
Além das alterações já mencionadas, a PEC 110/2019 propõe algumas outras mudanças tributárias, são elas:
• Extinção da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e incorporação ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ);
• Possibilidade de atualização da base de cálculo do IPTU uma vez a cada quatro anos, sem a necessidade de lei, nos termos definidos em lei municipal
• Transferência de responsabilidade do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), da esfera estadual para a federal, com a arrecadação integralmente destinada aos municípios;
• Ampliação da base de incidência do Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), para incluir aeronaves e embarcações, com a arrecadação total destinada aos municípios (não haverá incidência do imposto sobre veículos utilizados exclusivamente na pesca artesanal ou sobre aqueles aquáticos destinados às populações indígenas e ribeirinhas que os utilizem para atividades de subsistência);
• Criação de fundos estadual e municipal para reduzir a disparidade da receita per capita entre os estados e municípios, com recursos autofinanciados pelo IBS destinados a investimentos em infraestrutura;
• Criação da Zona de Processamento de Exportações do Maranhão (Zema);
• Autorização de criação de adicional do IBS para financiar a previdência social;
• Exclusão da cobrança de laudêmio sobre os terrenos da marinha localizados em ilhas costeiras que contenham a sede de municípios;
• Eliminação da imunidade sobre papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos.
Danielly Fernandes – Repórter freelancer
Fonte: JOTA