Liminares afastam instrução normativa que restringe benefício fiscal do Perse
Pelo menos duas empresas conseguiram liminares afastando os efeitos da Instrução Normativa (IN) 2.114/2022, que restringe os benefícios fiscais previstos no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). As decisões, proferidas pela Justiça Federal em Porto Alegre (RS) e no Rio de Janeiro (RJ), são as primeiras que se tem notícia envolvendo a IN.
Publicada em 1º de novembro, a Instrução Normativa 2.114 prevê que as alíquotas zero de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins previstas no Perse só poderão ser aproveitadas sobre receitas e resultados operacionais relacionados a eventos sociais e culturais e serviços turísticos. Assim, os benefícios podem ser usufruídos apenas sobre receitas com a realização de congressos, feiras, eventos esportivos, shows, festas, hotelaria e prestação de serviços turísticos, entre outras atividades.
A redação da IN proíbe a aplicação da alíquota zero sobre resultados não relacionados às atividades listadas, sobre receitas financeiras ou sobre receitas e resultados não operacionais.
O texto é alvo de críticas por supostamente inovar em relação ao disposto na Lei 14.148/2021, que instituiu o Perse. Isso porque o artigo 4º da norma define apenas que ficam reduzidas a zero, por 60 meses, as alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre o resultado das empresas abrangidas pelo Perse, sem trazer maiores restrições.
“A lei do Perse não fala que o benefício deveria ser aplicado exclusivamente sobre a receita daquela atividade incentivada. A lei tem uma redação que vai no sentido de que, sendo uma atividade listada como elegível ao Perse, seria possível aplicar a alíquota zero sobre os tributos incidentes sobre o resultado da pessoa jurídica”, diz Adriano Rodrigues de Moura, sócio do Mattos Filho Advogados.
A argumentação de que a Instrução Normativa extrapola seu poder de regulamentar foi aceita por pelo menos dois juízes, que de forma liminar afastaram as restrições trazidas pelo texto. O precedente mais recente data de 7 de dezembro, e foi proferido pelo juiz Ricardo Nüske, da 13ª Vara Federal de Porto Alegre. A decisão consta no mandado de segurança 5062734-21.2022.4.04.7100.
Para Nüske, a alíquota zero prevista na Lei 14.148/2021 “abrange a integralidade das receitas e resultados” das empresas, não podendo a IN trazer restrições. “A Instrução Normativa RFB n. 2.114/2022 extrapolou os limites do seu poder regulamentar, limitando indevidamente a extensão do benefício fiscal conferido pelo Perse”, afirmou ao deferir a liminar.
Nüske suspendeu eventuais cobranças feitas contra a empresa que ajuizou a ação pelo aproveitamento da alíquota zero dos tributos, além de proibir que a Receita Federal em Porto Alegre autue a companhia pelo não recolhimento dos impostos e contribuições.
O advogado da companhia gaúcha, Reginaldo Bueno, sócio da área tributária do Carvalho Machado e Timm Advogados, destaca que o texto do projeto de lei que deu origem à Lei 14.148/2021 era mais restritivo em relação à utilização do benefício da alíquota zero. Houve, na visão do tributarista, uma opção consciente do legislador de ampliar a utilização da alíquota zero.
O PL 5638/20, que deu origem à Lei 14.148/2021, previa em seu texto original que ficariam reduzidas a zero as alíquotas incidentes sobre “as receitas decorrentes das atividades de eventos”.
O segundo precedente localizado pelo JOTA envolve uma empresa do ramo de alimentação. A liminar favorável à companhia foi proferida em 6 de dezembro pelo juiz Marcus Lívio Gomes, da 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro.
Para Gomes, a Lei 14.148/2021 “não ressalvou qualquer tipo de receita” ao dispor sobre a alíquota zero dos tributos, não sendo possível a restrição pela IN.
Na opinião do advogado Thiago Marques, que é sócio do Bichara Advogados e defende a empresa no processo, a IN veio na contramão do que diz a lei que criou o Perse. “A lei fala dos resultados auferidos pela empresa, e não os auferidos com as atividades X, Y, Z”, afirma.
Marques ressalta que a edição da IN gera o risco de autuação para as empresas que já estão usufruindo do Perse, já que até então não havia restrição sobre a extensão do aproveitamento da alíquota zero.
O processo analisado pela 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro envolve outro ponto polêmico relacionado ao Perse: a inscrição no cadastro do Ministério do Turismo (Cadastur) na época da publicação da Lei 14.148/21. A obrigação de ter o cadastro para usufruir do programa consta da Portaria 7.163/21, que também é questionada por tributaristas por supostamente ir além do que está previsto na lei que instituiu o Perse.
Na decisão liminar, Gomes permite que a empresa usufrua dos benefícios do programa sem cumprir o requisito trazido pela portaria. Para o juiz, “a mencionada Lei nº 14.148/2021 apenas determinou que o Ministério da Economia estabelecesse os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos (artigo 2º, §2º), sem impor qualquer condição”.
Bárbara Mengardo – Editora em Brasília.
Fonte: JOTA