Eleição envolverá embate entre duas visões populistas na condução da política econômica

Rogério Werneck
Economista, doutor pela Universidade Harvard,
Quase quatro décadas após a redemocratização, o Brasil defronta-se com melancólica escolha entre dois candidatos a presidente flagrantemente populistas, inaptos, cada um à sua maneira, para conduzir com sucesso o País na complexa travessia dos próximos quatro anos.
Não faltará quem se apresse a ponderar que, por populistas que sejam, há diferenças gritantes entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro. Não há dúvida quanto a isso. Mas até mesmo para realçar o que há de diferente é importante ter clareza sobre o que há de similar entre eles.
A eleição de domingo envolverá um embate entre duas visões inequivocamente populistas da condução da política econômica que, por antagônicas que pareçam, têm muito em comum.
O que há de diferente entre, de um lado, a obstinação com que Lula quer se livrar do teto de gastos ou de qualquer outra restrição similar e, de outro, o inconformismo de Bolsonaro com limitações à expansão de despesas no Orçamento da União? Que diferença há entre as propostas de ingerência na gestão da Petrobras que vêm sendo defendidas por Lula e por Bolsonaro?
São pontos em comum que ilustram de forma contundente um mesmo traço inconfundível do governante populista: a resistência a regras institucionalizadas que possam limitar seu espaço de manobra na condução da política econômica.
O candidato que se eleger terá de lidar com um quadro fiscal intrincado, marcado por rigidez de gastos, perda de controle do Poder Executivo sobre o Orçamento e pressões políticas colossais por expansão de dispêndio. Entravado pelo voluntarismo populista, ser-lhe-á difícil manter a economia em crescimento e o emprego em expansão, com equilíbrio fiscal e inflação sob controle. E, sem isso, nunca é demais insistir, todas as demais políticas públicas estarão condenadas a terem eficácia muito limitada.
Mas boa parte do eleitorado está determinada a votar num candidato pela simples aversão que nutre pelo outro. Há quem, alarmado com a truculência, o primitivismo e os arreganhos antidemocráticos de Bolsonaro, esteja disposto a votar em Lula de olhos fechados. E quem, tomado por irrefreável repulsa por Lula e pelo PT, se disponha a bancar os riscos da reeleição de Bolsonaro.
Tanto de um lado como de outro, o que se contempla é que o vencedor venha a ser recompensado com generosa “licença para gastar” em 2023, seja para arcar com a conta do vale-tudo de Bolsonaro, seja para entregar infindáveis promessas irresponsáveis de campanha. De contenção de gastos se trata depois. Quem sabe, em 2024. Ou 2025.


Fonte: Estadão

Traduzir »