Executivos de finanças reconhecem seu papel no ESG, mas dizem que ainda é possível evoluir
O crescimento da pauta ESG, que agrupa questões ambientais, sociais e de governança, dentro das empresas pede que todos estejam envolvidos, desde o alto comando até a parte operacional. Dentro disso, os executivos de finanças (ou CFOs, da sigla em inglês Chief Financial Officer) são parte fundamental para que as companhias possam iniciar as jornadas em busca de bons processos internos e de impactos positivos para a sociedade e o meio ambiente. Uma pesquisa da consultoria PwC e do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef) perguntou aos CFOs suas opiniões sobre o tema.
O levantamento ouviu profissionais ligados a 80 companhias, de diversos portes, e trouxe informações sobre as três questões. A tomada de consciência sobre a importância da pauta foi demonstrada pela maioria, com 64% dos entrevistados envolvidos na estratégia ESG de suas organizações. Em relação ao meio ambiente, por exemplo, 79% consideram os riscos climáticos como relevantes ou muito relevantes, número que aumenta para os temas sociais (99%).
Por outro lado, os próprios entrevistados indicam que ainda há um caminho longo a percorrer na jornada para aplicar o ESG de forma ampla. Mais de 60% indicam que suas empresas não têm indicadores de sustentabilidade harmonizados de acordo com padrões internacionalmente aceitos. Outros dados dão conta de que apenas 31% dos participantes considera que a estrutura de governança da companhia onde trabalham é adequada para tratar de temas socioambientais e mais de 80% não estão confortáveis com a forma como as organizações incorporam os riscos socioambientais na gestão.
O diagnóstico é de que os próprios CFOs ainda podem se engajar mais na pauta, dada a importância que tem dentro das empresas. “Eles têm que participar da formulação da estratégia, para não se tornarem meros cumpridores de metas estabelecidas. Se a empresa coloca meta individual de bônus ou incentivo para o ESG, sem explicar o porquê, vira mais uma caixinha para colocar um ok”, avalia Meily Franco, vice-presidente do IBEF-SP e coordenadora da pesquisa.
Essa falta de engajamento é demonstrada por meio de dados compilados no levantamento, como o de que 64% dos gestores financeiros estão envolvidos na execução da estratégia ESG de suas empresas (ou seja, 36% não estão); ou de que mais de metade diz que sua empresa não monitora os riscos socioambientais da cadeia de valor ou não sabe responder sobre o tema. Ainda houve 35% de entrevistados que afirmaram que suas empresas não emitem nem pretendem emitir relatórios de sustentabilidade e quase metade entende o seu papel como protagonista nos temas ESG. “Há um caminho a ser perseguido para que os 64% virem 100% de respostas. Aquele que está abaixo é onde devemos nos preocupar”, afirma Meily.
Boa parte das métricas são financeiras ou passam pelo setor financeiro, sendo medidas por meio de pontos que levam em conta o dinheiro – como os investimentos para melhorar a governança e aumentar a diversidade ou a forma como é praticada a responsabilidade corporativa, ou seja, como a empresa pratica ações sociais. “[O CFO] tem que estar muito engajado. Ele tem que conhecer os conceitos ESG e depois saber como medir porque será exigido no cumprimento dessas metas”, comenta Mauricio Colombari, sócio da PwC Brasil.
Dentro disso, a governança é vista como o ponto de partida, já que é a partir dela que a organização se estrutura para perceber riscos e oportunidades ESG e, de fato, melhor sua atuação nas questões ambientais e sociais, a partir de informações sobre quais ações são mais efetivas. “A governança conecta tudo. Se não coloca os pilares como propósito, como visão de longo prazo e modelo de negócio, não tem como estruturar o ESG”, avisa Colombari.
Um ponto defendido pela PwC e o Ibef na publicação é a criação de padrões melhores para avaliação e publicação de informações financeiras e não financeiras ligadas ao tema. De acordo com a pesquisa, apenas 23% dos CFOs informam que suas organizações têm um processo maduro para medição dos temas socioambientais com indicadores e metas claramente definidos. Franco avalia que a importância de estabelecer a padronização é a de que todos passam a estar na mesma página e a cumprir pelo menos um mínimo. “Uniformizar e dar uma diretriz às empresas é positivo. O que preocupa é só fazer aquilo e nada além. Nunca vai ser só daquele jeito, cada empresa e segmento são diferentes”, comenta.
O relatório define como desafios, além da padronização, as gestões de riscos, oportunidades e compromissos, e atender novas demandas do mercado financeiro. “O CFO julga como relevante e que ele precisa participar, mas em contrapartida ainda faltam dados, conhecimentos, melhor gestão dos riscos e transparência nas informações prestadas”, resume Colombari.
Mais dados
Entre as empresas que estão estudando e as que não têm como responder, 68% não têm compromissos de descarbonização, ou seja, de reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa o máximo possível e compensar as restantes de outras formas, capturando as que já estão na atmosfera. Empresas europeias e de estados americanos como a Califórnia já têm mecanismos para medir essas emissões.
Colombari alerta que a situação ainda pode custar dinheiro no futuro para as empresas, seja por não se adequarem a padrões definidos pelo mercado ou por governos e terem que pagar multas ou juros mais altos, além da pressão dos consumidores. “É um dado preocupante. Hoje, a descarbonização é vista em primeiro momento como um gasto, mas pode ser questão de sobrevivência, no sentido de que vai precisar investir para colher frutos no futuro em novas tecnologias”, avisa o sócio da PwC.
Outro ponto relevante é que a maioria dos CFOs (79%) entendem que os incentivos fiscais são relevantes ou muito relevantes para o avanço da agenda ESG. Assim, para eles, o Estado deveria criar mecanismos para premiar, através de menos impostos ou facilidades em licitações, que as empresas adotem a pauta e ajudem a cumprir as contribuições nacionalmente determinadas de redução de emissões, assumidas voluntariamente por cada país. Meily tem uma opinião contrária. “Reconheço que pode ser ponto de partida, mas pagar sua cota justa de tributos faz parte do que é devolvido para a sociedade pela empresa. A mentalidade não deveria ser utilitária ou estar atrelada a ter um incentivo para fazer o que já deveria estar fazendo, como cuidar do meio ambiente ou ampliar a diversidade”, diz a vice-presidente do Ibef.
Por fim, 47% dos gestores financeiros afirmam que as organizações não têm mecanismos para quantificar os impactos dos investimentos sociais. A situação pode se dar pela dificuldade de calcular – enquanto nas questões ambientais é possível calcular quanto foi reduzido de emissões, de gasto de água e energia ou de geração de resíduos, as ações sociais podem vir a ter efeitos apenas depois de anos, como no caso das educacionais. “É muito tênue, intangível, precisa ter um pouco de criatividade e apoios técnicos. Reportar o impacto de forma imediata é muito mais difícil. Mas essa dificuldade não pode diminuir o interesse que as empresas têm para esse investimento”, cita Colombari.
Fonte: Estadão