STJ pode julgar em repetitivos se incentivos de ICMS integram a base do IRPJ/CSLL
Entre incentivos estão redução da base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento e outros
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode julgar como repetitivos dois recursos que discutem se incentivos fiscais relacionados ao ICMS devem ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Entre esses incentivos estão a redução da base de cálculo, a redução de alíquota, a isenção, o diferimento e a aplicação de imunidade tributária quanto ao ICMS, entre outros.
O tribunal escolheu dois recursos como representativos da controvérsia: os REsps 1945110/RS e 1987158/SC. O primeiro é de autoria da Fazenda Nacional e o segundo, da empresa Fast Indústria e Comércio LTDA. Segundo o STJ, na 1ª e 2ª Turmas do tribunal já foram proferidas 391 decisões monocráticas e 55 acórdãos sobre o tema.
O STJ enviou os dois recursos para que o Ministério Público Federal (MPF) se manifeste sobre a sua admissibilidade como representativos da controvérsia e aguarda um posicionamento. Depois disso, os ministros decidirão, por meio de votação no plenário virtual, se afetarão os recursos como repetitivos. Em caso positivo, eles serão levados à 1ª Seção do STJ para julgamento, ainda sem data prevista.
A proposta é que os ministros decidam se o entendimento fixado quanto ao crédito presumido de ICMS deve ser estendido para os demais incentivos de ICMS. Em 2017, no julgamento do EREsp 1517492/PR, a 1ª Seção do STJ decidiu que o crédito presumido de ICMS não integra a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Naquele julgamento, os ministros concluíram que, caso a União tribute o incentivo concedido a título de crédito presumido de ICMS, isso significaria um esvaziamento ou redução do próprio incentivo fiscal concedido legitimamente pelos estados. Para o STJ, cobrar IRPJ e CSLL sobre esse incentivo seria um estímulo à “competição indireta com o estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da federação”.
A tributarista Cristiane Romano, sócia do Machado Meyer Advogados, explica que, no julgamento sobre o crédito presumido de ICMS, o STJ discutiu, sobretudo, o respeito ao pacto federativo.
“O racional do precedente foi saber se, caso a União tributasse o incentivo fiscal concedido pelos estados, isso afetaria o pacto federativo. Ou seja, o STJ concluiu que, caso o crédito presumido de ICMS fosse tributado pelo IRPJ e pela CSLL, esse benefício seria mitigado ou até mesmo anulado, com uma violação ao pacto federativo. Na prática, o estado daria o benefício com uma mão e a União tiraria com a outra”, afirma Cristiane.
Para a advogada, esse entendimento deveria ser aplicado aos demais incentivos fiscais de ICMS, tendo em vista também o respeito ao pacto federativo. “A meu ver, o STJ deverá analisar a questão sob a mesma ótica”, diz Cristiane.
A tributarista Ariane Costa Guimarães, sócia do Mattos Filho Advogados, afirma que, além de entender que tributar o crédito presumido de ICMS anularia o benefício concedido pelos estados, o STJ concluiu que o incentivo fiscal representa uma renúncia de receita para os estados, mas não uma receita nova para os contribuintes.
“Quando o STJ diz que o crédito presumido de ICMS não é uma receita dos contribuintes, mas uma renúncia de receita para os estados, ele está dizendo que não estou diante de uma receita passível de tributação”, explica Ariane.
1ª e 2ª Turmas estendem entendimento a outros incentivos
Depois que a 1ª Seção decidiu pela exclusão do crédito presumido de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, outros processos chegaram ao STJ com o pedido para que o entendimento fosse estendido para outros incentivos fiscais de ICMS.
Em 8 de março de 2022, por exemplo, a 1ª Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que os incentivos fiscais recebidos pelos contribuintes por meio do Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense (Prodec) não integram a base de cálculo do IRPJ e da CSLL. A controvérsia foi objeto do REsp 1222547/RS e envolveu a empresa Vonpar Refrescos S/A.
Por meio do Prodec, as empresas podem postergar o pagamento do ICMS, com juros reduzidos e sem correção monetária, como um incentivo à implantação ou expansão de empreendimentos industriais. Conhecido como pagamento diferido de ICMS, o incentivo reduz, na prática, os custos da empresa.
Na ocasião, a relatora, ministra Regina Helena Costa, aplicou no caso o mesmo entendimento fixado para o crédito presumido de ICMS. Para a ministra, caso a União tribute o incentivo recebido pelas empresas, isso esvaziará ou reduzirá o objetivo do programa, de estimular a implantação e expansão de empreendimentos industriais.
“É induvidoso o caráter extrafiscal conferido pelo legislador estadual à desoneração, consistindo a medida em instrumento tributário para o atingimento de finalidade não arrecadatória, mas sim incentivadora de comportamento com vista à realização de valores constitucionalmente contemplados”, disse Regina Helena, ao proferir o seu voto.
Já em 5 abril de 2022, a 2ª Turma do STJ, por unanimidade, decidiu devolver um processo que discutia a incidência do IRPJ e da CSLL sobre incentivos fiscais de ICMS ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para nova análise. Para os magistrados, diferentemente do decidido pelo tribunal de origem, esses incentivos podem ser classificados como subvenção para investimento e, portanto, ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A decisão foi tomada no REsp 1968755/PR, de autoria da empresa Do Vale Filho Comercial de Alimentos LTDA. A 2ª Turma decidiu devolver o processo ao tribunal de origem, e não reformá-lo diretamente, por entender que seria necessário aplicar outra legislação ao caso e também reexaminar provas.
Ariane Costa Guimarães, do Mattos Filho Advogados, lembra que, neste caso, a 2ª Turma entendeu que o incentivo fiscal de ICMS deveria ser considerado subvenção como investimento e, portanto, não poderia ser tributado. A seu ver, esse critério pode ser observado em outros julgamentos.
No caso concreto, os ministros entenderam que deveriam ser aplicados o artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e o artigo 30 da Lei 12.973/14. O primeiro dispositivo classificou as isenções de ICMS como subvenções para investimento. O segundo, por sua vez, definiu que as subvenções para investimento não serão computadas na determinação do lucro real, o que, no caso concreto, permite a exclusão dos incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
“Quando o STJ classifica os incentivos fiscais como subvenção para investimento, isso significa que, em qualquer hipótese, para fins tributáveis, esses valores não serão considerados receita e, portanto, não serão tributados”, diz Ariane.
Cristiane Bonfanti – Repórter do JOTA em Brasília.
Fonte: JOTA