Difal de ICMS: o que a derrubada de liminares diz sobre a posição dos TJs?
Tema na 2ª instância pode ser analisado considerando mais as contas públicas do que o direito do contribuinte
No capítulo mais recente da novela envolvendo o Difal de ICMS, temos diversos Tribunais de Justiça derrubando liminares de 1ª instância favoráveis às empresas. A queda das medidas, permitindo a cobrança do diferencial de alíquota em 2022, tem se dado, em alguns casos, por meio de suspensões de segurança, o que permite a anulação simultânea de dezenas de liminares.
O movimento nos TJs, porém, levanta o questionamento: a derrubada indica que, no mérito, os desembargadores decidirão a polêmica sobre o momento de cobrança do Difal de forma desfavorável aos contribuintes?
Desde fevereiro, levando em consideração apenas as decisões tomadas em suspensão de segurança, pelo menos 417 liminares envolvendo o momento de cobrança do Difal foram derrubadas por presidentes de Tribunais de Justiça. O instituto foi utilizado em pelo menos 13 estados e no Distrito Federal.
JOTA PRO Tributos: Tudo que você precisa saber sobre o sistema tributário brasileiro em um só lugar
A última unidade federativa a se valer do mecanismo foi São Paulo, e no dia 25 de março 19 liminares que beneficiavam empresas foram derrubadas simultaneamente. O posicionamento tomado pelo presidente da Corte, entretanto, não destoa do que vinham entendendo os demais desembargadores do tribunal.
Uma busca na jurisprudência do TJSP mostra que em março chegaram ao tribunal pelo menos nove agravos contra decisões de 1ª instância que analisaram liminares relacionadas à possibilidade de cobrança do Difal em 2022. Apenas uma delas foi decidida de forma favorável ao contribuinte.
TJs. O instituto é regulamentado pela Lei 8.437/1992, que permite que em caso de “grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas” o Poder Público recorra diretamente ao presidente do tribunal para tentar suspender liminares.
Por ser um recurso que pode ser interposto apenas pelo Poder Público e por ter como destinatário o presidente do TJ, a suspensão de segurança é vista como uma saída com uma alta carga política. Para o advogado Breno Kingma, do Vieira Rezende Advogados, o instituto pode ser até mesmo descrito como autoritário. “Passa por cima de uma quantidade enorme de juízes”, afirma.
No caso do Difal, a análise pelos presidentes tem como base o impacto das liminares aos cofres públicos, sem entrar na discussão sobre a necessidade de atendimento aos princípios da anualidade ou noventena.
O “peso” da discussão, aliás, varia bastante de estado para estado. A procuradoria do Ceará, por exemplo, aponta no recurso ao TJ que as 12 liminares questionadas implicariam em queda de R$ 50 milhões por mês de arrecadação. Já Distrito Federal e Pernambuco estimam que o efeito multiplicador das medidas geraria um impacto de R$ 600 milhões e R$ 653,7 milhões às finanças estaduais, respectivamente.
Goiás, por sua vez, alega que pode ocorrer uma perda de arrecadação próxima a R$ 1 bilhão com liminares permitindo a cobrança do Difal apenas em 2023. A cifra é semelhante à apresentada por São Paulo, que defendeu ao TJ que uma conta conservadora revela que entre abril e dezembro de 2022 será arrecadado R$ 1,6 bilhão com Difal de ICMS.
Apesar de se apegarem ao debate sobre arrecadação, em algumas das decisões os presidentes dos TJs dão algumas “pistas” relacionadas ao mérito. É o caso da suspensão de 30 liminares no Espírito Santo em fevereiro. Além de considerar que há prejuízo aos cofres públicos, o presidente do TJ estadual analisou a questão de fundo relacionada ao Difal: se é necessário o respeito aos princípios da noventena ou anualidade para a efetiva cobrança do diferencial.
Para Fabio Clem de Oliveira, presidente do TJES, a cobrança do Difal poderia ser feita em 2022 porque “não haveria que se falar em instituição ou mesmo majoração de novo tributo, de modo que, aparentemente, inexistiria sujeição à regra da anterioridade”.
Situação curiosa ocorreu no Piauí, onde o presidente do TJ derrubou uma liminar por meio de suspensão de segurança. A decisão, porém, se estende às “liminares já proferidas e as supervenientes que versem sobre a mesma questão”, ou seja, o entendimento do magistrado atinge outras liminares não elencadas pela procuradoria e mesmo medidas ainda não deferidas.
Para além do que está escrito nas decisões, porém, é comum a visão de que o cenário que está se formando nos TJs é ruim aos contribuintes. Para tributaristas, a queda de liminares por meio de suspensões de segurança demonstra que o tema, pelo menos em segunda instância, pode ser analisado levando em consideração muito mais as contas públicas do que o direito do contribuinte em si.
Afinal, é essa a mensagem que está sendo passada até agora: dezenas de liminares sendo derrubadas não com base na discussão relacionada à necessidade de observação da noventena, da anualidade ou de nenhum dos dois princípios, mas pela queda de arrecadação ocasionada pela concessão de medidas favoráveis às empresas.
Tributaristas temem que, em relação ao mérito, a tendência seja similar às liminares. Importante destacar, ainda, que até lá os estados provavelmente já estarão cobrando o Difal. A maioria das unidades federativas informou que irá cobrar o diferencial entre o final de março e o começo de abril.
A resposta definitiva deverá mesmo vir do STF, que conta com quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) sobre o tema. A resposta de lá, porém, pode não ser tão célere quanto os contribuintes esperam. Apesar de o relator, ministro Alexandre de Moraes, ter determinado que os casos fossem julgados com o rito abreviado, os processos ainda estão com a Procuradoria-Geral da República (PGR), e não podem ir à pauta.
Conheça o JOTA PRO Tributos
Bárbara Mengardo – Editora em Brasília.
Fonte: JOTA