Os 5 anos de Alexandre de Moraes no STF em 10 fatos

Moraes teve embates com a PGR, suspendeu o Telegram, foi alvo de pedido de impeachment movido por Bolsonaro e virou meme

Em 22 de março de 2017, Alexandre de Moraes tomou posse no cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), depois de ter sido indicado pelo então presidente da República Michel Temer (MDB) para ocupar a vaga de Teori Zavascki, vitimado por uma acidente de avião.

Desde que assumiu a cadeira, Moraes se destacou devido ao seu trabalho como relator de investigações de grande repercussão, como o inquérito das fake news e os inquéritos contra o presidente da República Jair Bolsonaro (PL). O ministro também foi alvo de um pedido de impeachment protocolado por um presidente da República, um fato inédito.

No dia em que Alexandre de Moraes completa cinco anos como ministro do STF, o JOTA elenca 10 fatos que marcam a trajetória do magistrado na Corte:

1) Alexandre de Moraes é o relator do inquérito das fake news
O inquérito das fake news foi aberto, de ofício, em março de 2019, pelo então presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, para investigar notícias falsas, ofensas e ameaças a ministros do STF e seus familiares. Moraes foi designado relator do inquérito, sem sorteio. Mais tarde, a investigação se voltou contra os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e confirmou a existência do ‘gabinete do ódio’.

Durante as investigações, Moraes determinou que a Polícia Federal cumprisse mandados de busca e apreensão em endereços de parlamentares, empresários e influenciadores bolsonaristas, entre eles o blogueiro Allan dos Santos.

“As provas colhidas e os laudos periciais apresentados nestes autos apontam para a real possibilidade de existência de uma associação criminosa, denominada nos depoimentos dos parlamentares como ‘Gabinete do Ódio’, dedicada a disseminação de notícias falsas, ataques ofensivos a diversas pessoas, às autoridades e às Instituições, dentre elas o Supremo Tribunal Federal, com flagrante conteúdo de ódio, subversão da ordem e incentivo à quebra da normalidade institucional e democrática”, escreveu o ministro em uma das decisões no inquérito.

Nesta investigação, Moraes coletou muitas informações sobre o funcionamento desta engrenagem de engajamento do presidente Jair Bolsonaro. O ministro, aliás, será o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante o período eleitoral.

Quanto ao inquérito das fake news, no início, a então procuradora-Geral da República Raquel Dodge chegou a arquivá-lo sob o argumento de afronta à separação de Poderes, à livre distribuição de processos, à regra do juiz natural da causa, à competência criminal originária do Supremo para processar e julgar ações ajuizadas contra autoridades com prerrogativa de foro na Corte e ao devido processo legal pela ausência de delimitação da investigação penal. A manifestação de Dodge, contudo, foi ignorada.

Em 2020, por 10 votos a 1, o inquérito foi considerado constitucional pelos ministros do STF. O voto vencido foi do ministro Marco Aurélio Mello.

2) Relator de inquéritos contra Bolsonaro
Com aposentadoria de Celso de Mello, Moraes assumiu, depois de sorteio, o inquérito sobre a interferência de Bolsonaro na Polícia Federal. Trata-se de uma investigação sobre uma possível interferência do presidente para beneficiar familiares e aliados políticos. O inquérito foi aberto após Sergio Moro, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública e agora pré-candidato à presidente da República, afirmar que Bolsonaro o pressionava para substituir o diretor-geral da PF e exigia acesso a relatórios sigilosos da corporação.

Além disso, Moraes também é relator do inquérito 4.878, que apura o vazamento de uma investigação sigilosa da Polícia Federal referente ao ataque hacker sofrido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2018. Os ministros do TSE, inclusive Moraes, pediram que Bolsonaro, o delegado da Polícia Federal Victor Feitosa Neves Campos, e o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) fossem investigados pelo crime de divulgação de segredo, tipificado no artigo 153, parágrafo 1º-A, do Código Penal brasileiro. O inquérito foi aberto pelo ministro e foi determinada a exclusão dos links dos documentos sigilosos publicados por Bolsonaro nas redes sociais. O PGR, Augusto Aras, requereu o arquivamento deste inquérito por entender que Bolsonaro não cometeu crime.

Também foi Alexandre de Moraes quem autorizou a abertura do inquérito para investigar Bolsonaro por associar as vacinas contra a Covid-19 a um suposto risco de desenvolver Aids. A informação falsa foi divulgada pelo presidente em uma transmissão ao vivo nas redes sociais no dia 22 de outubro de 2021. A decisão do ministro atendeu um pedido da CPI da Covid-19.

“Não há dúvidas de que as condutas noticiadas do Presidente da República, no sentido de propagação de notícias fraudulentas acerca da vacinação contra a COVID-19 utilizam-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, revelando-se imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados, especialmente diante da existência de uma organização criminosa – identificada no Inquérito 4.781/DF”, diz trecho da decisão de Moraes.

3) Embates de Alexandre de Moraes com a PGR
Alexandre de Moraes e o procurador-geral da República Augusto Aras foram protagonistas de uma série de embates envolvendo pedidos de investigação contra Bolsonaro e seus aliados no Planalto.

Um dos embates ocorreu após Moraes aceitar o pedido de investigação de Bolsonaro feito pela CPI da Covid. Normalmente, um inquérito é aberto depois de requerimento da PGR, no entanto, o ministro fundamentou que a CPI tem “legitimidade para pleitear apurações de supostas condutas criminosas descobertas durante a realização de suas investigações”, a PGR havia se manifestado pelo arquivamento do pedido. A decisão foi proferida na PET 10.007.

Em dezembro de 2021, Moraes concedeu um habeas corpos de ofício determinando que a PGR trancasse a investigação interna contra o presidente Bolsonaro, no caso dos crimes apontados pela CPI da Pandemia.

A decisão do ministro foi uma resposta a Augusto Aras, que havia argumentado que a PGR já estava investigando o caso. Aras pedia que o STF revertesse a abertura do inquérito contra Bolsonaro e que Moraes não fosse o relator do processo.

Moraes afirmou que a necessidade de encaminhamento da investigação conduzida pelo Ministério Público ao Supremo não é discricionária da PGR. “Não se possibilita à Procuradoria-Geral da República, portanto, ainda que manifeste sua irresignação contra a decisão de instauração por meio de agravo regimental, o não cumprimento da decisão proferida, notadamente no que diz respeito ao envio do procedimento interno instaurado para investigação dos fatos apurados neste Inquérito, pois, como visto, não se revela consonante com a ordem constitucional vigente, sob qualquer perspectiva, o afastamento do controle judicial exercido por esta Corte Suprema em decorrência de indicação de instauração de procedimento próprio”.

Moraes também autorizou a realização de buscas contra Ricardo Salles, então ministro do Meio Ambiente, sem ouvir previamente a PGR, que só foi informada da operação no dia da deflagração.

4) Pedido de impeachment movido pelo presidente da República
Em uma medida inédita, no dia 20 de agosto de 2021, o presidente Jair Bolsonaro protocolou um pedido de impeachment contra um ministro do STF no Senado Federal. O alvo era Alexandre de Moraes. Bolsonaro solicitou a destituição do cargo no STF e o afastamento de Moraes das funções públicas por oito anos.

O pedido foi feito após Moraes expedir mandatos de busca e apreensão contra o cantor Sérgio Reis, o deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ) e outros apoiadores do presidente que planejavam protestos de caráter golpista no dia 7 de setembro de 2021.

A solicitação foi rejeitada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, por “manifesta ausência de tipicidade e de justa causa”. O presidente, conduto, sempre que contrariado volta a atacar verbalmente o ministro do STF.

5) Determinação de bloqueio do Telegram
O ministro Alexandre de Moraes determinou o bloqueio do Telegram no Brasil pelo descumprimento reiterado de decisões judiciais e estabeleceu uma multa diária para o Telegram até o cumprimento da decisão.

No entanto, o bloqueio foi revogado após a empresa cumprir as ordens do ministro. O Telegram informou ao STF que nomeou o advogado Alan Campos Elias Tomaz como representante da plataforma no Brasil e que irá adotar medidas para combater a desinformação e a divulgação de informações falsas no aplicativo. Além disso, o aplicativo excluiu publicações de um canal de mensagens do presidente Jair Bolsonaro e bloqueou o canal de Claudio Lessa, listado por Moraes como disseminador de fake news.

“Considerado o atendimento integral das decisões proferidas em 17/3/2022 e 19/3/2022, revogo a decisão de completa e integral suspensão do funcionamento do Telegram no Brasil”, diz Moraes em sua sentença.

No mesmo dia da divulgação da suspensão, o fundador do Telegram, o russo Pavel Durov, pediu desculpas ao STF pela “negligência” ao não cumprir ordens judiciais que resultaram no bloqueio do aplicativo no Brasil. “Definitivamente, poderíamos ter feito um trabalho melhor”, escreveu Durov em seu canal no Telegram.

Durov justificou o não cumprimento dizendo que “parece que tivemos um problema com e-mails entre nossos endereços corporativos do telegram.org e o Supremo Tribunal Federal”. Ao comentar a decisão de Moraes, Bolsonaro voltou a criticá-lo. “Sabemos da posição do Alexandre de Moraes. É uma perseguição implacável para cima de mim”, disse.

6) Rejeição de denúncia contra Bolsonaro
Foi um voto de Moraes que impediu Bolsonaro de se tornar réu numa ação penal anterior ao mandato de presidente. Ele deu o voto decisivo para a rejeição de denúncia contra o então deputado federal Jair Bolsonaro, pelo crime de racismo, por ter se referido ao peso de quilombolas por arrobas, medida usada para pesagem de animais. A denúncia foi oferecida à Corte pela Procuradoria-Geral da República após declarações feitas durante uma palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em abril de 2017.

A denúncia trazia frases proferidas por Bolsonaro durante o evento: “Eu fui em um quilombola [sic] em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano gasto com eles”.

Outra declaração foi de que, se fosse eleito presidente em 2018, não destinaria recursos para ONGs e que não haveria “um centímetro demarcado” para reservas indígenas ou quilombolas. “Se depender de mim, todo cidadão vai ter uma arma de fogo dentro de casa. Não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola”, disse à época.

Moraes desempatou o julgamento e seguiu o voto do relator, Marco Aurélio, no sentido de que não ficou configurada a prática de crime.

“As declarações são totalmente desconectadas da realidade, mas no caso em questão, apesar da grosseria, da vulgaridade, não me parece ter extrapolado limites da sua liberdade de expressão qualificada”, afirmou o ministro na ocasião. Segundo o ministro, Bolsonaro fez críticas a políticas do governo e não discurso de ódio.

7) Prisão em flagrante de Daniel Silveira
Moraes foi o responsável por decretar, de ofício, a prisão em flagrante do deputado federal Daniel Silveira (União- RJ) após a publicação de um vídeo no qual o parlamentar ataca os ministros do STF e defende o Ato Institucional nº 5 (AI-5). O deputado foi preso em fevereiro de 2021.

Ao fundamentar a prisão, Alexandre de Moraes apontou que a “Constituição não permite a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático nem tampouco a realização de manifestações nas redes sociais visando o rompimento do Estado de Direito”.

Em abril do ano passado, por decisão unânime, Silveira se tornou réu no STF. “Liberdade de expressão não se confunde com uma anarquia, a defesa de fechamento do Congresso Nacional, do STF. Sempre me refiro ao binômio liberdade com responsabilidade”, disse Moraes.

Hoje o deputado se encontra em liberdade. A ação penal contra Silveira foi liberada para ser pautada no dia 21 de janeiro de 2022, mas ainda não tem data para ser julgada.

8) Farpas de outros ministros
Ao longo destes 5 anos, já foram registradas discussões acaloradas entre Moraes e colegas. Em março de 2021, o ministro Marco Aurélio sugeriu que o plenário votasse a substituição da prisão de Silveira – que estava preso desde 16 de fevereiro – por medidas menos gravosas. A sugestão acabou desencadeando uma discussão mais acalorada. O então decano chamou Moraes de “xerife” e o presidente Luiz Fux de “autoritário”.

Para Marco Aurélio, como o tribunal havia referendado a prisão do deputado, sua revogação também poderia ocorrer por análise do plenário. Moraes discordou do pedido, explicando que cabia a ele analisar este tema, e o presidente Luiz Fux declarou o adiamento do processo. O decano insistiu: “Presidente, eu fiz uma proposta, e espero que pelo menos ela passe pelo crivo do colegiado”. Moraes então rebateu: “Eu como relator, estou adiando o julgamento, e não trago este pedido. E como o ministro Marco Aurélio sempre ressalta, há de se valorizar o relator, então não há julgamento iniciado.”

“Longe de mim, depois de 42 anos de colegiado, desrespeitar o relator. Ainda mais se o relator é um xerife”, retrucou Marco Aurélio.

Anteriormente, em maio de 2017, Moraes e Marco Aurélio protagonizaram uma discussão durante o julgamento de um habeas corpus. Ao expor seu voto, Moraes afirmou que havia apurado informações em pesquisa no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP). Neste momento, Marco Aurélio interveio e alfinetou Moraes ao dizer que não julga “fora do que está no processo” e não pesquisa “sítio de qualquer tribunal para trazer no habeas corpus elementos contrários ao próprio objetivo do habeas corpus”. “Eu não encontro tempo para diminuir meu acervo processual, enquanto os colegas podem pesquisar fora, inclusive, do processo? Que milagre é esse?”, questionou.

Moraes também chegou a ser criticado pelo ministro Celso de Mello, que divulgou uma mensagem em defesa da liberdade de expressão e de imprensa após uma reportagem da revista Crusoé ser censurada por determinação de Moraes.

A matéria, de abril de 2019, mencionava um e-mail de Marcelo Odebrecht em que ele se referia a Dias Toffoli como “o amigo do amigo de meu pai” e foi removida por Moraes sob a justificativa de ser um “material supostamente criminoso e ilegal”.

Celso de Mello argumentou: “a censura, qualquer tipo de censura, mesmo aquela ordenada pelo Poder Judiciário, mostra-se prática ilegítima, autocrática e essencialmente incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República”.

9) Produtividade de Alexandre de Moraes
Durante os cinco anos na cadeira do STF, Alexandre de Moraes conseguiu reduzir seu acervo de 6.597 para 681 processos, uma redução de 90%. Moraes é o ministro fora da presidência com o menor acervo atualmente.

Depois de Moraes, o gabinete com menos ações é o da ministra Cármen Lúcia, com 822 processos. Logo em seguida, está o gabinete da ministra Rosa Weber, com 1.160 processos. O maior acervo atual de um ministro fora presidência é o do ministro Edson Fachin, com 2.849 processos.

O presidente Luiz Fux – que durante a mandato na Presidência não recebe novos processos no gabinete – tem um acervo de 98 processos como relator, enquanto na presidência acumula outras 4.385 ações.

10) Memes com Alexandre de Moraes
Nas redes sociais, as decisões do ministro geraram muitos memes — alguns em tom crítico e outros, elogioso.


Fonte: JOTA

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