Congresso aprova mudança no ICMS sobre combustíveis texto vai a sanção

Câmara rejeitou gatilhos colocados pelo Senado que permitiam reajuste em casos de defasagem das alíquotas em momentos de mudança súbita nos preços

O Congresso concluiu na madrugada desta sexta-feira (11) a votação do projeto de lei que altera a cobrança de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre combustíveis e zera as alíquotas de PIS/Cofins sobre diesel e gás até o fim de 2022, ano eleitoral.

A votação ocorreu após a Petrobras anunciar um mega-aumento nos preços de gasolina e diesel. Congressistas criticaram a medida, que ampliou a pressão por ações para conter os efeitos na bomba.

Na Câmara, o placar foi de 414 a 3 a favor do texto em comum nas duas Casas. Por 290 a 128, os deputados também decidiram suprimir dois dispositivos do Senado. Agora, o projeto vai à sanção do presidente Jair Bolsonaro (PL).

O relator do texto na Câmara, deputado Dr. Jaziel (PL-CE), decidiu suprimir dois dispositivos que criavam gatilho para reajuste extraordinário em casos de defasagem das alíquotas do ICMS em momentos de alta ou queda súbita nos preços de combustíveis.

\”Se o texto visa justamente dar maior estabilidade ao valor dos combustíveis, não vemos lógica em permitir reajustes em períodos inferiores aos fixados justamente quando houver variações relevantes desses valores.\”

O PT, que obstruiu a votação por críticas à política de preços da Petrobras, acabou sendo favorável ao projeto.

\”Nós não estamos falando que vamos votar contra este projeto, mas nós não aceitamos enganar o povo brasileiro\”, disse o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG). \”Esse governo tem compromisso é com o mercado financeiro, é com os acionistas especulativos da Petrobras. Estão destruindo a Petrobras\”, destacou.

O Novo também obstruiu, mas sob justificativa de plenário esvaziado. \”Faltam 500 Deputados, presidente, que não podem falar nesta sessão\”, afirmou o líder do partido na Câmara, Tiago Mitraud (MG).

No Senado, o texto-base foi aprovado por 68 votos a 1, com uma abstenção, após sucessivos adiamentos e constantes tentativas dos governadores de evitar perdas na arrecadação dos estados. Em votação de destaques, os parlamentares aprovaram a desoneração de tributos federais sobre diesel e gás por 56 votos a 8.

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), disse lamentar o reajuste da Petrobras, mas afirmou que o projeto pode reduzir a \”impacto zero\” a alta de 24,9% no diesel. Já o aumento na gasolina não seria amortecido diretamente pela proposta, ele admitiu.

A mudança no ICMS é apoiada pelo presidente Jair Bolsonaro, que há meses trava uma queda de braço com os governadores em torno da culpa pelo aumento dos reajustes.

O chefe do Executivo tem preocupação com os efeitos políticos da alta dos combustíveis, sobretudo no ano em que buscará a reeleição. Ele está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Enquanto o presidente acusa os estados de lucrar com a alta nos preços, via arrecadação do ICMS, os governadores apontam o dedo para a política de preços da Petrobras, cujo acionista controlador é a União.

Em diferentes ocasiões, Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, defenderam uma contribuição dos governadores para conter o preço dos combustíveis. Com apoio do Planalto, o governo federal abrirá mão de uma arrecadação de R$ 18 bilhões para zerar as alíquotas de PIS/Cofins sobre diesel e gás até o fim do ano.

Os estados, por sua vez, alegam que a medida não solucionará o problema e reclamam da perda de arrecadação.

\”Queremos ajudar a baixar o preço, e não podem mais botar a culpa no ICMS\”, disse o governador do Piauí, Wellington Dias (PT). \”Aceitamos tratar do ICMS no consumo na reforma tributária, onde está ICMS sobre combustíveis e também energia e outros. Mas com a responsabilidade de compensação de receitas.\”

Dias afirmou ainda que o projeto votado é inconstitucional e que vai recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal). \”Não vamos aceitar tirar dinheiro do povo, pois dinheiro público é do nosso povo, para mandar para a jogatina da especiação e lucros como dos R$ 103 bilhões da Petrobras distribuído para aplicadores, do povo pobre para bolso dos mais ricos\”, ressaltou.

Pelo texto do PLP 11, os estados deverão regulamentar a criação de uma alíquota única de ICMS sobre os combustíveis no âmbito do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária). Além disso, o texto prevê a mudança no modelo da alíquota, de um porcentual sobre o valor (ad valorem) para um valor fixo sobre o litro (ad rem).​

A alíquota única deverá ser aplicada sobre gasolina, diesel, etanol e gás de cozinha. Inicialmente, também valeria para querosene para aviação, mas os deputados excluíram a possibilidade. Embora unificadas entre os estados, as cobranças poderão ser diferenciadas por tipo de combustível, de acordo com o texto.

Enquanto isso não for implementado pelos governadores, o imposto sobre o diesel e o biodiesel deverá ser cobrado sobre uma base de cálculo definida, obtida pela média móvel dos últimos cinco anos.

A regra, tratada como uma transição, valeria até 31 de dezembro de 2022. Na prática, o texto força uma mudança imediata no imposto.

Os governadores tentaram emplacar uma emenda que congelaria o preço médio ponderado sobre o qual é calculado o ICMS dos combustíveis —a base de cálculo já está fixada desde 1º de novembro de 2021.

A articulação foi um dos motivos por trás do adiamento na votação, antes prevista para quarta-feira (9). Mas o relator, senador Jean Paul Prates (PT-RN), disse que a emenda resultaria em solução ainda pior para os estados.

\”Cheguei à conclusão que é pior para eles, porque [o congelamento do preço de referência] é sobre todos derivados e lubrificantes. A outra [regra] é só sobre diesel, então vamos deixar como estava, 60 meses, que é o acordo que temos com a Presidência [do Senado]\”, disse.

A votação do projeto que altera os tributos sobre combustíveis é a aposta da Economia para tentar aplacar a crescente pressão por subsídios diretos para reduzir o preço dos combustíveis. A pasta comandada por Guedes tenta minimizar danos e resiste à medida.

Nesta semana, a ala política do governo e a própria Petrobras defenderam ao presidente Jair Bolsonaro a criação de um subsídio para o diesel, nos moldes do que foi feito durante o governo Michel Temer (MDB) em 2018, durante a greve dos caminhoneiros.

Cenários internos do governo apontam custo de R$ 27 bilhões para bancar manter integralmente a defasagem atual de preços no diesel por mais três meses. O valor teria que ser repassado por meio de crédito extraordinário, que fica fora do teto de gastos –um cenário que Guedes quer evitar a qualquer custo.

Por outro lado, no Palácio do Planalto, a avaliação é que a aprovação do projeto no Senado não tira a necessidade de implementar subsídios para reduzir de forma mais ágil o preço na bomba. Por isso, essa hipótese segue com força na ala política, que credita a Guedes o fato de uma ação nesse sentido ainda não ter saído do papel.

A expectativa de técnicos da área econômica era que houvesse certo alívio nas cotações do dólar e do petróleo, que aceleraram na esteira da invasão da Ucrânia pela Rússia. O anúncio do reajuste pela Petrobras, porém, acabou mantendo a pressão elevada por subsídios.

O aumento foi criticado no plenário do Senado. \”A gente está fazendo justamente o oposto. A oposição, o PT, o Senado estão trabalhando. A Petrobras está aumentando combustível\”, disse o relator Jean Paul Prates.

\”O anúncio teve repercussão negativa\”, disse a senadora Rose de Freitas (MDB-ES).

Para conseguir aprovar o projeto de lei, a Economia precisou aceitar um acordo com a bancada de parlamentares do Amazonas para desfazer parte do corte nas alíquotas do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

O governo federal vai reeditar o decreto que fez uma redução linear de 25% no imposto deixando de fora produtos da Zona Franca de Manaus, que já são isentos e perdem competitividade com o corte do IPI.

Mais cedo, também no Senado, foi aprovado projeto de lei que cria uma conta de estabilização para amortecer reajustes e estabelece diretrizes para uma nova política nacional de preços. O projeto, porém, não foi colocado na pauta da Câmara.

O texto ainda dobra o alcance do Auxílio Gás, pago a beneficiários do Auxílio Brasil, e cria um auxílio-gasolina no valor de R$ 300 mensais para taxistas, motoristas de aplicativo e entregadores. Motoristas habilitados para conduzir ciclomotor ou motos até 125 cilindradas receberiam um valor menor, de R$ 100.

Pela proposta, a nova política de preços de combustíveis deve observar diretrizes como a redução da volatilidade de preços internos e prever uma frequência para o anúncio de reajustes.

Uma conta abastecida com o excesso de dividendos pagos pela Petrobras e receitas com royalties e participações especiais seria usada para compensar produtores e importadores sempre que o preço de mercado ficar acima do preço de referência estipulado na política —assim, o aumento não seria repassado às bombas.

O Ministério da Economia critica a conta de estabilização porque impõe à União o custo de bancar a fatura para conter os preços dos combustíveis —diferentemente do texto do ICMS, que tinha apoio do governo.

Os técnicos avaliam ainda que o mecanismo tem baixa eficácia, uma vez que o mercado de combustíveis é grande, e seus integrantes podem repassar mais rapidamente reajustes diante da segurança de que o governo pagará a diferença.

Fontes da área econômica também veem risco ao teto de gastos, principal âncora fiscal do governo. Para fazer os desembolsos da conta de estabilização, o governo poderia ter de driblar o teto.

Já a criação dos benefícios pode esbarrar na lei eleitoral, que proíbe a criação de novas políticas sociais em ano de realização de eleições. O relator reconheceu que a medida que o novo auxílio pode ser implementado apenas em 2023.

A proposta da conta de estabilização e dos benefícios também precisa passar pela Câmara, mas deve ter uma tramitação mais lenta, uma vez que o texto teve origem no Senado e é inédito aos olhos dos deputados.


Fonte: Folha de São Paulo

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