Apesar das negações, vem mais carga tributária
A medida aprofunda as distorções na economia e deixa claro que a recuperação econômica não está entre as prioridades do governo Bolsonaro
Celso Ming*, O Estado de S.Paulo
18 de setembro de 2021 | 08h00
O aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) determinado pelo presidente Jair Bolsonaro aprofunda distorções na economia. E mostra que não vale nada a palavra do governo, tantas vezes repetida, de que não haverá aumento da carga tributária.
A alíquota do IOF cobrada das empresas sobe de 1,5% ao ano para 2,04% ao ano. E a das pessoas físicas, de 3,0% ano para 4,08% ao ano. Esse adicional vem para obter mais R$ 2,14 bilhões até o fim deste ano para cobrir as despesas do Auxílio Brasil. Esse auxílio social extra não vem mais para garantir uma compensação para o trabalhador de baixa renda em consequência da paralisação determinada pela pandemia, porque essa ameaça foi atenuada pelo avanço da vacinação. Trata-se de uma decisão de cunho populista cujo objetivo é dar alguma viabilidade à candidatura do presidente Bolsonaro nas eleições do ano que vem.
O uso do IOF está sendo deformado. Este é um imposto regulatório. Mas passa a ser usado como instrumento de arrecadação. O governo já não liga mais para a finalidade de seus instrumentos. É como usar o telefone para pregar prego na parede. Preferiu servir-se de um imposto regulatório porque, ao contrário dos impostos arrecadatórios que começam a valer só no exercício seguinte, o imposto regulatório tem vigência imediata.
A principal consequência prática dessa nova mordida é aumentar o custo do crédito para o tomador. Atinge também as operações de câmbio (inclusive as despesas com cartão de crédito no exterior), as operações com cheques especiais e o prêmio pago para a contratação de seguros.
Além de ter de enfrentar a alta vigorosa dos juros definida pela política monetária do Banco Central, o consumidor terá de pagar mais esse pedágio para facilitar a campanha de Bolsonaro.
O pagamento de novas despesas públicas com aumento de impostos só não é pior do que seria o recurso às emissões de moeda ou ao aumento da dívida pública.
Essa esticada no custo do crédito vem num momento em que as empresas e as famílias já estão fortemente endividadas e já não vinham conseguindo enfiar as despesas financeiras para dentro do seu orçamento. Parece inevitável agora certo aumento da inadimplência.
A nova restrição do crédito acontece no contrapé da atividade econômica. Os produtores já vinham sendo desestimulados pela disparada da inflação, pela crise hídrica, pela queda dos investimentos, pela deterioração das contas públicas e pelas incertezas políticas. Agora vem mais essa. O financiamento habitacional estava soltando soluços por falhas de motor. Agora, enfrenta mais um tranco.
Decididamente, esta não é a melhor maneira para combater o desemprego e a queda da renda. Para expressar a mesma coisa de outra maneira, ficou claro que a recuperação econômica não está entre as prioridades do governo. E, diante de mais esses custos para o consumidor, aumentam as dúvidas sobre o resultado final pretendido pelo governo, porque recessão e mais desemprego não são boas notícias para o eleitor. Na última sexta-feira, 17, a empresária Luiza Trajano, presidente do Conselho de Administração do Grupo Magazine Luiza, avisou que o brasileiro já não aguenta mais tanta carga de impostos. E nunca é demais lembrar que a Inconfidência Mineira começou com a derrama; começou com o aumento do confisco determinado pela coroa portuguesa sobre os produtores de então.
Cabe uma preocupação final. Se o governo não tem escrúpulo em marcar gol com a mão agora, imagine-se do que será capaz quando tiver de enfrentar o rombo dos precatórios, a disparada da dívida ou a rejeição do eleitor.
*CELSO MING É COMENTARISTA DE ECONOMIA
Fonte: Estadão