China promete retaliar países que se aliarem aos EUA contra seus interesses no comércio global
O governo chinês fez um alerta nesta segunda-feira, 21, outros países contra a adoção de medidas para restringir o comércio com a China com o objetivo de obter alívio das tarifas americanas. Os chineses prometeram retaliar os países que fizerem isso.
O Ministério do Comércio da China afirmou estar respondendo a reportagens da mídia estrangeira que indicavam que o governo do presidente Trump estava tentando pressionar outros países quanto ao comércio com a China como tática de negociação.
A conciliação não trará paz, e concessões não conquistarão respeito”, disse o ministério em um comunicado. “Buscar as chamadas isenções prejudicando os interesses de outros por ganhos egoístas e míopes é como negociar com um tigre pela sua pele. No fim, isso só levará a uma situação de perde-perde.”
A China “se opõe firmemente a qualquer parte que tente chegar a um acordo às custas dos interesses chineses”, acrescentou o ministério, dizendo ainda que tomará “contramedidas de forma decidida”.
A administração Trump não declarou oficialmente que pressionaria países a limitar o comércio com a China em troca de alívio tarifário. No entanto, o próprio Trump deu sinais de que está aberto a essa possibilidade. Na semana passada, em um programa da Fox News em espanhol, o apresentador perguntou a Trump se os países da América Latina deveriam ser forçados a escolher entre investimentos chineses e americanos.
“Talvez, sim, talvez”, respondeu Trump. “Eles deveriam fazer isso.”
Os Estados Unidos eram o maior mercado individual para produtos chineses antes das tarifas mais recentes, mas o governo chinês já vinha há anos trabalhando para diversificar seus mercados de exportação, em parte para se proteger contra o aumento das tensões com Washington.
Desde a escalada mais recente, a China tem se esforçado para fortalecer seus laços com outros países, tanto para mostrar que não ficará isolada quanto para se apresentar como uma alternativa confiável frente a um parceiro americano imprevisível.
O líder chinês, Xi Jinping, recebeu o primeiro-ministro da Espanha no início deste mês e visitou vários países do Sudeste Asiático na semana passada. No Vietnã, Xi conclamou outros países a se unirem à China na defesa do livre-comércio e de “um ambiente internacional aberto e cooperativo”. Na Malásia, ele pediu que a região “rejeite o desacoplamento, a interrupção de cadeias de suprimento” e o “abuso tarifário”.
A mídia estatal chinesa também destacou, nesta segunda-feira, declarações do principal responsável pelo orçamento do Reino Unido, que afirmou que cortar laços com a China seria “insensato”. Autoridades chinesas também têm feito contato com representantes da União Europeia, Japão e Coreia do Sul.
O que está em jogo para a China não são apenas seus laços comerciais diretos com outros países, mas também uma rota potencial para que seus produtos continuem chegando aos Estados Unidos. Nos últimos anos, fabricantes chineses construíram fábricas em países como Vietnã e México, o que lhes permite continuar vendendo para os EUA sem o rótulo “Made in China”. Caso esses países limitem o comércio com a China, essas rotas indiretas estariam ameaçadas.
Já há sinais de que alguns países podem oferecer concessões relacionadas à China aos Estados Unidos. Autoridades vietnamitas prometeram reprimir o transbordo, uma prática em que mercadorias são enviadas por meio de um terceiro país com tarifas mais baixas. Autoridades americanas acusaram a China de utilizar o Vietnã para fazer esse tipo de operação.
Outros países também evitaram endossar abertamente os apelos da China por uma aliança contra as tarifas americanas. Após uma conta em rede social vinculada à mídia estatal chinesa afirmar que China, Japão e Coreia do Sul haviam concordado com uma resposta conjunta, uma autoridade sul-coreana afirmou que a declaração era “um tanto exagerada”.
Ainda assim, os países têm receio de ofender a China. O Vietnã, por exemplo, não mencionou explicitamente a China ao prometer combater fraudes comerciais.
E mesmo antes do comunicado do Ministério do Comércio na segunda-feira, a China já havia deixado claro que não hesitaria em adotar táticas mais duras, além das iniciativas diplomáticas. Em março, impôs tarifas de até 100% sobre óleo e farelo de canola, carne suína e outros alimentos vindos do Canadá. As tarifas, em tese, eram uma resposta às tarifas canadenses sobre produtos chineses. Mas a mídia estatal chinesa também afirmou que se tratava de um alerta ao Canadá para que não se aproximasse demais de Trump em prejuízo da China.
Muitos países provavelmente hesitariam em ceder às exigências de Washington, afirmou Bert Hofman, ex-diretor do Banco Mundial e atualmente professor adjunto na Universidade Nacional de Cingapura.
O estilo errático de formulação de políticas da administração Trump tornaria um pacto comercial anti-China uma empreitada arriscada, já que os EUA poderiam mudar de ideia da noite para o dia”, disse ele.
Mas alguns países, como o Vietnã, provavelmente têm pouca escolha além de priorizar os Estados Unidos, observou Zhiwu Chen, professor de finanças da Universidade de Hong Kong. Ele destacou como o Vietnã reorientou sua economia para atrair marcas americanas e de outros países estrangeiros para fabricar no país. “Eles realmente não têm muita margem de manobra para ficar do lado da China e ao mesmo tempo desagradar aos EUA”, afirmou.
Fonte: Estadão